Mais um confinamento geral. Mais um murro no estômago para uma economia frágil como a nossa. Entre a saúde e a economia a resposta é inevitável, para qualquer pessoa preocupada: a saúde. Mas, (e este é um “mas” enorme), a escolha não pode deixar dúvidas a pairar.

No entanto, na ida para o segundo confinamento, este país pouco ou nada aprendeu ao longo do ano de 2020. Zero.

Voltamos a fechar com mil e uma excepções. Com sinais contraditórios e com o direito à indignação de muitos sectores. Justos, por sinal.

Estamos em pleno período eleitoral para o mais alto cargo da Nação. Uma eleição presidencial onde os candidatos passeiam em campanha na rua, fazem jantares e comícios e o povo está confinado em casa. Dizem-nos para ficar em casa. Todos. Mas, a política, bem essa está a passear na rua. Como pode um empresário da restauração, por exemplo, ter respeito por estas normas, impostas pela crise de saúde pública, perante o circo político-mediático que está montado? O vírus não vai às campanhas eleitorais? Não ataca os políticos?

Chama-se exemplo. Ou melhor, dar o exemplo. E dar o exemplo, sobretudo um bom exemplo, obriga a que não existam comportamentos contraditórios, quando obrigamos a que tantos sectores tenham a obrigação de fechar ou cumprir regras bem apertadas para se manter a funcionar.

Não tenhamos dúvidas, 2021 será mais um ano perdido. Espero, para o bem de todos nós, estar rotundamente enganado, porém, atentos à grandeza dos números (contágios e mortos), um mês de confinamento, poderá não ser suficiente. Os cépticos da pandemia devem ser lembrados do efeito inegável, sobre a progressão da pandemia, do último confinamento. Já os cépticos, no outro extremo, acham que tinha menos “buracos” do que a versão em vigor.

E no meio de campanhas e de discussão de tipos de restrição, com algumas polémicas superficiais, chegam-nos imagens de filas de ambulâncias no Hospital de Santa Maria e no Hospital de Torres Vedras. Chegam-nos imagens de doentes em camas, nos corredores dos hospitais, por esse país fora. Isto sim é revoltante. Isto sim demonstra que não há Serviço Nacional de Saúde capaz de, sozinho somente com os seus recursos, dar resposta às necessidades das pessoas em situação emergente. E aqui, perdoem-me os puristas, a razão é puramente ideológica. É inacreditável que, em Janeiro de 2021, não exista uma resposta integrada do sector público, social e privado.

Quanto custa fazer parar a nossa economia? Será que não tinha compensado, lá atrás, gastar mais em equipamento e recursos humanos para a área da saúde? Não teria feito sentido, sobretudo com a chegada do inverno e do frio? Custava muito gastar 2 ou 3 mil milhões de euros e estarmos preparados, ao invés de fazer parar a economia desta forma? Vamos gastar na mesma.

Como é possível não existir um centro de planeamento das camas disponíveis em todos os sectores? Como é possível não fazer a gestão de meios, pessoas e capacidade para a pandemia que estamos a atravessar? Tudo é avulso. Tudo é em cima do joelho. Já soubemos este ano que os Administradores hospitalares criaram um grupo de Whatsapp para trocarem impressões e pedirem apoio. Isto é o pináculo da má Administração Pública. Isto é o falhanço de uma governação. Total. Em que ninguém assume a liderança. Em que ninguém assume as consequências. Gestão? Boas práticas? Rigor? Cooperação? Resultados? Métricas? Avaliação? Não. Show-off puro e apenas. E nem sequer parece valer a pena falar de responsabilização, que isso é coisa que o actual elenco governativo desconhece, quase me arriscaria a dizer que poderia cair o céu em cima das nossas cabeças antes de um Membro do actual Governo assumir as consequências das suas decisões ou omissões.

O drama no meio disto tudo é a indiferença, estamos transformados numa sociedade em anomia, os princípios e as regras parecem não contar para todos. Mais polémica, menos polémica, seguimos em frente, sem olhar para atrás, sem reflectir ou procurar perceber. Sem responsabilidade, sem autoridade, mas acima de tudo sem exemplo. E um povo sem exemplo não se governa, nem se deixa governar.

Não há economia, nem lábios pintados a batom vermelho redentor, no meio deste caos. Nos momentos de crise contam não só as palavras, contam, e falam mais alto do que elas, os actos dos líderes, daqueles que o são para lá do cargo, pois não é o hábito que faz o monge. Não é por acaso, que muitas vezes se diz liderar pelo exemplo…

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