&conomia à 2ª

E depois das moratórias?

Mário Centeno, ele próprio, agora no cargo de Governador do Banco de Portugal (e com uma vida muito mais descansada e amena), divulgou o número de moratórias aplicadas aos contratos de crédito concedidos pela Banca em Portugal. Assustador, ou não estivéssemos a falar de 46 mil milhões de euros.

Como disse e bem José Eduardo Martins, isto sim é uma verdadeira bazuca. Daquelas que estão municiadas e, caso disparem, causarão danos enormes.

O prazo está marcado. Setembro de 2021. A razão, desta calendarização, não se sabe bem qual é. Aludir à data de realização das eleições autárquicas é lembrar uma singela coincidência. O calendário é o que é. Mas e depois? Sim, depois das moratórias expirarem como é? É que os números, olhando com maior atenção, demonstram que tanto foram pedidos por empresas como por famílias. Acima dos 20 mil milhões de euros em cada segmento.

É muito. É uma economia em suspenso, com uma garrafa de oxigénio de que se vê o nível de enchimento a baixar, sem saber quando se irá recarregar, com o oxigénio mais forte, o do crescimento. E é um desafio tremendo para a Banca comercial no geral. Sim, a “terrível” Banca que tanto é atacada neste país. Um dos defeitos que temos, enquanto povo, é não saber separar o trigo do joio. Um é mau, são todos iguais. Não são. Felizmente. E, também por isso, as moratórias são um desafio financeiro e económico tremendo que temos pela frente.

Por isso mesmo repito, como será o dia seguinte? Como terão as empresas e as famílias capacidade de voltar a pagar os seus empréstimos, se o crescimento económico, que levanta os rendimentos, não voltar a ser o que era ou como o Orçamento de Estado estima? Mais, com a acumulação de prejuízos, com gastos que não contavam, com impostos que aqui e ali, são também protelados, mas continuam a pesar no balanço das empresas, como ficará a saúde das finanças empresariais?

Este é o grande desafio. Já o escrevi aqui várias vezes. Continuo a chamar a atenção, pois não vejo debate sério e detalhado sobre este tema. Não vejo ideias, projectos ou até as cerimónias que em Portugal são sempre muito bem organizadas, mas de conteúdo duvidoso.

Sobre o dia seguinte? Zero. Zero respostas, zero propostas, zero preocupações. Quando chegar o dia logo se vê. Típico.

Somos um país sem rumo, em modo deixa andar. Eu sei que não é fácil gerir uma pandemia. Mas esta forma de governar de mera gestão diária, de show-off e pouca capacidade de planeamento, dizendo-se tudo e o seu contrário não auspiciam nada de bom. Os casos sucedem-se. Eu repito, este país está sem rumo. Como, para desagrado dos indignados do costume, Aníbal Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho demonstraram nas suas recentes intervenções. De forma cristalina. E que diferença de qualidade de intervenção, mas sobretudo, de visão do estado de coisas.

É que ser Primeiro-Ministro a todo o custo, com mais jogos de bastidores ou capacidade de manutenção de poder é muito interessante. No entanto, a factura para o país de ter um Primeiro-Ministro e um Governo sem um mínimo de visão de futuro, capturado por agendas que vão de nacionalizações a conflitos entre as gaivotas e humanos, demonstram bem que o nosso futuro não está a ser bem preparado, algo que nos deveria preocupar a todos.

Valha-nos duas coisas. Que não dependem, em grande medida, de nós portugueses, obviamente. Falo da vacina e das Coronabonds. A esperança de ter uma vacina que volte a repor alguma normalidade na vida das pessoas é um dos maiores feitos da ciência médica e farmacêutica, que terá uma repercussão económica muito significativa que só podemos desejar ser de rápida inoculação, sobretudo nos mais frágeis e naqueles que estão na linha da frente do combate à pandemia. Felizmente a afirmação de que as vacinas vão chegar a todos os países veio da União Europeia, logo podemos ter um pouco mais esperança. Mas também da Europa sabemos que com manutenção de uma política de emissão de Coronabonds, como tão bem recordou o Presidente executivo do BCP Miguel Maya, numa excelente entrevista ao Público, é a garantia de que podemos continuar a sonhar em ser um país que honra compromissos.

Valha-nos a Ciência e a Europa. Pouco mais nos resta, com estes protagonistas ao leme de um navio a que falta definir a rota, vagueando sem rumo.

Votos de um Santo Natal, dentro do possível, para todos.

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