BLITZ 40 anos: “Havia toda uma cultura juvenil emergente que ansiava por uma publicação que refletisse a sua voz”, Adolfo Luxúria Canibal
Adolfo Luxúria Canibal (Mão Morta)
RUI DUARTE SILVA
Em contagem decrescente para a grande festa do 40º aniversário da BLITZ, pedimos a músicos, promotores e jornalistas que resgatem recordações de quatro décadas de história. “A expectativa era grande para saber se finalmente a explosão cultural em curso ia ter um porta-voz duradouro. O êxito do jornal veio provar que sim”, defende Adolfo Luxúria Canibal, dos Mão Morta
No momento em que entramos em contagem decrescente para agrande festa dos 40 anos da BLITZ, na Meo Arena, em Lisboa, a 12 de dezembro – com concertos de Xutos & Pontapés, Capitão Fausto, Gisela João e MARO –, pedimos a músicos, promotores, jornalistas, radialistas e outras personalidades que vão ao baú resgatar memórias de quatro décadas de história, deixando-nos, também, uma mensagem para o futuro.
“A minha recordação mais antiga é o n.º 1 do semanário, de Novembro de 1984, com a [Siouxsie] Sioux na capa”, recorda Adolfo Luxúria Canibal, eterno vocalista dos Mão Morta. “No seguimento do punk e sobretudo do pós-punk, bem como do chamado boom do rock português, havia toda uma cultura juvenil emergente que ansiava por uma publicação que refletisse a sua voz, e o BLITZ veio suprir essa necessidade. Tinha havido o pioneiro e fugaz ‘Rock Week’, em maio de 1980, que duraria apenas uns escassos três meses, de modo que, quando surge o BLITZ, a expectativa era grande para saber se finalmente a explosão cultural em curso ia ter um porta-voz duradouro, se a identidade de uma nova geração era suficientemente forte para aguentar financeiramente um projecto jornalístico que a expressasse e unisse, e que tratasse a generalidade dos seus gostos e preocupações. O êxito do jornal veio provar que sim”.
Para o músico, o jornal BLITZ, “sobretudo sob as direcções do Manuel Falcão e do Rui Monteiro, mas também da Sónia Pereira, foi instrumento essencial para o desenvolvimento da massa crítica nacional”. “A sua panorâmica semanal sobre o meio musical não só lisboeta, mas também nacional, sobre os acontecimentos mais relevantes que ocorriam, sobre os discos, sobre os concertos, sempre com um ponto de vista crítico, firme e sustentado, foi fundamental para o crescimento e consolidação desse novo paradigma do ser músico em Portugal e do seu papel. Isto para além, claro, das novidades que veiculava sobre o mundo da música anglo-saxónica e internacional, fora do circuito mais mainstream, numa época em que a internet não existia. O BLITZ, para além da opinião crítica, era a fonte da informação", salienta. "E, como tal, todas as terças-feiras era ansiosamente aguardado”.
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Adolfo explica ainda que a publicação não teve impacto só na música. “Contribuiu para o aparecimento ou sustento de muitos e bons fotógrafos, que depois seguiram o seu caminho, como a Inês Gonçalves, o Daniel Blaufuks, o Álvaro Rosendo ou, claro, a eterna Rita Carmo”, diz. “Mas também para a crítica musical, quer directamente, através da escolha criteriosa dos muitos redatores que integrou, como o Rui Monteiro, o Luís Maio, o grande chefe de redacção António Pires, o António Sérgio, o Pedro Gonçalves, a Sónia Pereira e tantos outros, quer indirectamente, pela replicação que originou em suplementos de jornais generalistas e mesmo no aparecimento de outros semanários, como o ‘LP’, todos tendo sempre como referência e modelo, para o bem e para o mal, o BLITZ”.
“Mas o seu maior contributo foi mesmo cultural, pelo incentivo à consolidação de uma cultura juvenil em Portugal, de criadores e consumidores, servindo de guia estético para as suas manifestações, sobretudo musicais, mas também de outras áreas, como a moda, o cinema ou as artes plásticas. Mas tudo isso é referente a tempos idos e o que deles ficou e fica (por enquanto) é apenas uma memória, a memória de quando o BLITZ era o BLITZ”. Questionado sobre o que deseja da BLITZ para o futuro, Adolfo Luxúria Canibal é peremptório: “O que se pode desejar de algo que já não existe verdadeiramente? Como cantava o Johnny Thunders, you can´t put your arms round a memory…”.