ARQUIVO 10 perguntas a... por Inês Meneses

Pedro Faro:“Aprendi com Júlio Pomar a valorizar a liberdade”

Formado em História da Arte, crítico e curador. Trabalha no Atelier-Museu Júlio Pomar, em Lisboa, desde a sua criação em 2013. É lá que continua a poder ser visitada a exposição “Júlio Pomar: Formas que se Tornam Outras” até 29 de setembro

O que deve ver primeiro um crítico de arte?
Para John Berger, “ver é um ato de escolha” (“Modos de Ver”). Não prescrevo deveres. Cada 'umx' olha para o que quer, para o que pode ver, para e como o que conseguir ver. Tu n’as rien vu…?

Há, neste tempo, uma nova forma de vermos a arte e os artistas?
As formas de ver, ser e sentir mudam ao longo dos tempos. O mundo (e a arte) está sempre em mudança. A forma como hoje vemos arte, e como vemos a arte e o papel ‘dxs’ artistas na sociedade, participa nessas mudanças constantes. A arte não mudará o mundo (?) mas pode mudar a forma como vemos o mundo… mudar (e acabar).

Quase sempre os artistas correspondem à sua obra?
Nunca me desiludi. Diria que quase sempre. Mas ‘muitxs’ superam a sua obra.

É menos interventiva e intervencionista a arte de hoje?
Toda a arte é intervenção no mundo, desde os deslumbrantes traços das gravuras paleolíticas do Foz Coa até à produção artística mais recente. E toda a arte é política, mesmo quando procura parecer que não é.

A vontade de chocar ganha terreno à própria criatividade?
Para responder que sim, teria de pensar no uso do choque como gratuito ou mero efeito formal/estilístico. Mas o conceito moderno de choque em arte, filosofia ou história, é muito mais do que isso. Partilha terreno com a ideia de criatividade, de consciência, de memória, de trauma e de vida.

O que aprendeu com Júlio Pomar?
A valorizar a liberdade. E, entre muitas coisas, relembro sempre uma frase que ele disse a propósito de Maio de 1968: “Os escudos da política eram grandes, redondos e opacos, e os bastões da polícia eram linhas retas e compridas.”

Os grandes artistas (como Pomar) morrem reconhecidos pelo país?
Em vida, Pomar foi justamente reconhecido pelo país, nas suas várias instâncias. Mas haverá grandes artistas que, por diversas razões, morreram sem esse reconhecimento em vida.

Ter uma estratégia (a que muitos hoje chamam marketing) colide com os princípios básicos da arte?
Colide se não houver nada além da estratégia (ou do marketing). Não colide, eventualmente, se X artista usar essas estratégias, operações e dispositivos de marketing como matéria de trabalho.

Quem foi, para si, o artista mais notável do século XX?
Felix González-Torres.

De que imagem se socorre para poder sonhar?
Está tatuada no meu braço direito: a imagem de dois relógios sincronizados na mesma hora, que Felix González-Torres desenhou, com tinta azul, na mais linda carta de amor, dirigida a Ross Laycock, seu namorado, com o título “Lovers, 1988”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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