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"Os azeites portugueses, mesmo a granel, são mais valorizados que os azeites espanhóis. Daí o grande interesse dos italianos"

"Os azeites portugueses, mesmo a granel, são mais valorizados que os azeites espanhóis. Daí o grande interesse dos italianos"
José Fernandes
Portugal passou a ser um país exportador de azeite, garantindo o suficiente para o consumo interno. Pedro Lopes, presidente da associação dos Olivicultores e Lagares de Portugal, OLIVUM, desenha o atual cenário e as perspetivas para a campanha de azeitona deste ano.

Quais as perspetivas para a campanha deste ano?

A próxima campanha 2023/24, não sendo extraordinária, será uma boa campanha e melhor que a campanha anterior, como era esperado. Assim, este ano estimamos que a produção nacional se possa situar na ordem das 140 mil toneladas de azeite, face às 126 mil toneladas da campanha anterior. Algumas fortes e sucessivas geadas que se fizeram sentir no final inverno/inicio da primavera condicionaram o potencial produtivo, impedindo que o ano seja melhor.

Quanto deste azeite se destina ao mercado nacional e ao mercado estrangeiro?

Segundo os dados disponíveis (Casa do Azeite e COI - Comité Oleícola Internacional) e na generalidade, poderemos dizer que Portugal exporta cerca de 180 mil toneladas de azeite e tem também um consumo doméstico de cerca de 55 mil toneladas, pelo que o diferencial terá de ser coberto também com algumas importações. Estamos hoje numa situação em que Portugal é largamente autossuficiente para o seu consumo, mas é também um importante exportador, situação completamente inversa ao início dos anos 2000, em que Portugal não produzia o suficiente para o seu consumo.

Qual o principal mercado de venda a granel? Que quantidade deste azeite foi vendida para o estrangeiro à saída dos lagares em 2022?

Os principais mercados para venda a granel à saída dos lagares são sem dúvida Itália e Espanha (se falarmos de azeite embalado já seria o Brasil). No entanto, não conseguimos precisar os dados relativos à percentagem de azeite vendido para exportação à saída dos lagares, uma vez que não são divulgados pelas entidades oficiais.

Qual a diferença de preço do azeite com rótulo português e com rótulo italiano?

O azeite Italiano tem efetivamente uma notoriedade internacional que lhe permitirá um diferencial de preço maior, não apenas relativamente ao azeite português, mas também a todos os restantes azeites. É de referir que Espanha é o maior produtor mundial de azeite, mas não consegue alcançar a notoriedade do azeite Italiano e consequente valorização. Aliás, consideramos que esta notoriedade e valorização de produtos Italianos não é algo exclusivo do azeite, mas de todos os produtos alimentares em geral, onde a marca “Itália” tem efetivamente um “plus” em temos de valor (massas, vinho, queijos, etc).

É importante a valorização do azeite português? De que forma?

É importante e acreditamos que o caminho para essa valorização tem estado a ser trilhado. O azeite português é muito bom, e isso é evidente quando vemos as classificações conseguidas pelo azeite nacional nos concursos internacionais por esse mundo fora. O que acontecia era que antes Portugal não produzia sequer para o consumo e por isso não era um país exportador, agora que temos dimensão, sobretudo com as novas plantações e modernização do olival no Alentejo, Ribatejo e até Trás-os-Montes, a produção ganha outra dimensão e interesse. Podemos admitir que hoje os azeites portugueses, mesmo a granel, são mais valorizados que os azeites espanhóis, por exemplo, daí o grande interesse que a região italiana mostra ter no nosso azeite.

Pedro Lopes, presidente da Associação dos Olivicultores e Lagares de Portugal

Os olivicultores recorrem a mão de obra estrangeira na região de Beja, onde o Expresso esteve em reportagem na semana. Como se processa a contratação destes trabalhadores e qual a dimensão destas comunidades na região?

O olival no Alentejo de hoje não é o mesmo de há anos atrás. Tem-se vindo a modernizar e cada vez menos se recorre a esse tipo de mão-de-obra. Neste momento, a maioria do olival é colhido de forma mecânica e automatizada, através de máquinas altamente eficazes e com tecnologia de última geração, manipuladas por colaboradores que são contratados para prestação de serviços nas empresas a tempo inteiro. O facto de serem colaboradores fixos nas empresas, permite-lhes terem a especialização necessária para a gestão destas máquinas em questão.

Quais os principais países de origem destes trabalhadores?

A Associação de Lagares e Olivicultores de Portugal não dispõe de informação atual e válida que permita responder a esta questão.

Qual a extensão de olival tradicional, intensivo e super intensivo na região?

Não temos dados disponíveis para saber com precisão, mas na região do Alentejo claramente a maior produção provém dos olivais modernos regados, cuja produtividade é mais consistente, mas relativamente a superfícies não significa que seja a maioria da superfície. No Alentejo existem ainda grandes superfícies de olival tradicional de sequeiro, sobretudo no baixo Alentejo interior e alto Alentejo.

Considera que é importante estender a zona de influência de Alqueva no Baixo Alentejo?

Seria muito importante pois com água aumentamos a resiliência das regiões. No entanto, face à pressão que existe atualmente sobre o Alqueva, consideramos que o mais importante e sensato é consolidar as áreas regadas que existem atualmente e pensar na defesa dessas zonas, garantindo o recurso a água para as áreas. São zonas onde o país e os produtores já fizeram grandes investimentos e estão a contribuir para a produção e balança comercial do país. Se ”esticarmos” o Alqueva estendendo a sua influência na situação atual, corremos o risco de não garantir água para os investimentos realizados e a água não chegar para os compromissos atuais.

A cultura intensiva de olival tem um forte impacto na região. Quais os desafios que se colocam a estes territórios?

Efetivamente o olival foi a cultura que mais rapidamente se implantou na região e, por isso, teve um impacto maior, o que não foi obra do acaso. Se pensarmos que o olival é uma cultura autóctone, que sempre existiu no Alentejo e melhor se adapta às condições de solo e clima existentes, a par com o conhecimento da cultura. Assim, facilmente se deduz o porquê da sua implantação ter sido tão rápida e ter atingido esta dimensão, em detrimento de outas culturas menos adaptadas e que exigem outro tipo de condições e exigências. Logicamente, hoje em dia, produção tem de ser sinónimo de sustentabilidade e sustentabilidade deve ser entendida nas suas três vertentes: ambiental, social e económica. Este é o desafio do sector e de quem quer sempre fazer mais e melhor. Nesse sentido a OLIVUM lançou recentemente o Programa de Sustentabilidade dos Azeites do Alentejo (PSAA) que visa criar um referencial de produção, desenvolvendo um certificado que valide o melhor azeite que se faz por cá, respondendo a este urgente desafio de produzir de forma ambiental, social e economicamente responsável.

O olival intensivo marca a paisagem do baixo Alentejo
José Fernandes

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: malmeida@expresso.impresa.pt

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