Homem torturado no Chile reconheceu-se numa foto na prisão 50 anos depois
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Com apenas 15 anos e sem dentes devido à tortura que sofreu, Vladimir Salamanca foi fotografado em 1973 pelo brasileiro Evandro Teixeira no Estádio Nacional do Chile, numa icónica foto na qual se reconheceu 50 anos depois, junto do irmão desaparecido.
“Depois dos primeiros dias de prisão, ouvimos barulhos vindos de uma escada. Apareceram fotojornalistas. Foi algo muito breve, entre um e dois minutos. Logo depois, chegaram os soldados e expulsaram os jornalistas. Esta é a fotografia que agora vejo e que reconheci no começo deste mês”, relembra à Lusa Vladimir Salamanca, hoje com 65 anos, enquanto aponta para uma ampliação da foto, exposta temporariamente no Museu da Memória, em Santiago, onde se evoca o golpe de estado de 1973.
A foto é considerada uma raridade porque mostra os presos que o golpista Augusto Pinochet sempre procurou esconder. É o último registo de Vladimir, junto ao irmão Gerardo Ismael, então com 24 anos, que até hoje é dado como desaparecido.
O fotógrafo Evandro Teixeira, hoje com 87 anos, conta à Lusa que uma das fotos mais destacadas daqueles primeiros dias do golpe de 11 de setembro de 1973 foi fruto de uma ousadia.
Teixeira trabalhava para o Jornal do Brasil quando foi enviado para cobrir o golpe que estarreceu o mundo, com o bombardeio do Palácio La Moneda, o suicídio do Presidente Salvador Allende e a transformação do Estádio Nacional do Chile num campo de concentração.
“Eu disse ao fotógrafo ‘avisem o mundo que nos tratam mal’, porque sabia que nos escondiam e porque eu convivia com a dor por ter perdido todos os meus dentes a golpes. Estes dentes que vês não são os meus originais”, indica Vladimir.
A foto de Evandro Teixeira, do dia 22 de setembro de 1973, revelou ao mundo os prisioneiros torturados num local do qual muitos não saíram vivos. Os jornalistas estrangeiros em Santiago foram chamados ao Estádio Nacional para registarem presos supostamente bem tratados e em condições adequadas, numa encenação para a imprensa.
Teixeira já conhecia o estádio por ter coberto o Mundial de 1962, quando a seleção brasileira de futebol se sagrou bicampeã, e num momento de desatenção dos militares, conseguiu ir aos subterrâneos do estádio, encontrando a realidade.
“Durante os dias 16 e 17 de setembro, fomos submetidos às humilhações mais incríveis que se possa imaginar contra um ser humano. Corte de cabelo, golpes, torturas, choques elétricos", descreve Vladimir aqueles primeiros dos 23 dias de horror, entre a prisão, em 16 de setembro e a libertação em 8 de outubro.
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WEBSTORY: EXPRESSO
TEXTO: LUSA
FOTOGRAFIAS: REPRODUÇÃO/LUSA; ACERVO IMS
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