6 novembro 2013 13:10

O investigador Luís Ferreira Moita com os médicos Nuno Figueiredo e Pedro Póvoa: a equipa do Instituto de Medicina Molecular (IMM) descobriu um novo tratamento para a sépsis, que mata 30% dos doentes atingidos pela doença.
jorge simão
Investigadores do Instituto de Medicina Molecular identificam novo tratamento para uma doença que é a maior causa de morte nas unidades de cuidados intensivos dos hospitais.
6 novembro 2013 13:10
Uma equipa de investigadores do Instituto de Medicina Molecular (IMM), da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, identificou um novo tratamento para a sepsis e acaba de publicar a descoberta na revista científica de referência mundial "Immunity".
Liderada por Luís Ferreira Moita, esta investigação poderá ter um grande impacto social e espera-se que, tendo em conta as descobertas feitas num modelo animal, seja possível contribuir para o tratamento eficaz da maior causa de morte em unidades de cuidados intensivos e a terceira causa de mortalidade hospitalar.
"Trata-se verdadeiramente de um grande avanço científico nesta área dada a necessidade urgente de novas opções terapêuticas para tratamento de uma doença que só nos Estados Unidos é responsável por mais de 200.000 mortes por ano", afirma Luís Moita.
30% de taxa de mortalidade
Apesar dos avanços conseguidos nas últimas décadas, a taxa de mortalidade anual global devido a sépsis é ainda de quase 30% dos doentes afectados. A fisiopatologia da sépsis continua a ser mal compreendida e nos últimos 50 anos a incidência e os custos associados aumentaram na ordem de um por cento por ano.
A investigação feita pelo IMM descobriu que o grupo das antraciclinas, substâncias aprovadas para uso clínico há várias décadas e vulgarmente utilizadas para o tratamento do cancro, são eficazes, quando usadas em baixas doses, no tratamento da sépsis grave em ratinhos.
Os resultados sugerem ainda que as antraciclinas podem ser usadas não só na prevenção da sépsis, mas também agir de forma terapêutica quando a sua administração é combinada com um antibiótico de largo espectro.
"É provável que esta terapêutica seja útil na prática clínica, de forma a reduzir a mortalidade por sépsis, em doentes que se encontram hospitalizados ou a necessitar de cuidados médicos durante as primeiras horas em que manifestem sintomas", salienta Luís Moita.
Primeiro ensaio clínico no Hospital de Santa Maria
A equipa liderada pelo investigador espera iniciar o ensaio clínico em 2014 num pequeno grupo de doentes para investigar a utilidade da epirrubicina, uma das antraciclinas, em doentes com sépsis de origem abdominal.
Se os resultados deste ensaio clínico confirmarem o mesmo que apenas uma pequena percentagem do efeito no modelo animal, o tratamento pode ser introduzido na prática clínica dentro de dois a três anos e assim contribuir para salvar dezenas de milhares de vidas todos os anos.
A ideia inicial partiu do médico cirurgião Nuno Figueiredo no laboratório de Luís Ferreira Moita, que se dedica à área da imunologia, e ganhou força porque "nas últimas décadas não houve progressos significativos na forma como os doentes de sépsis são tratados", constatou este investigador, em declarações feitas ao Expresso no passado mês de Maio.
Os cientistas pegaram nos fármacos já aprovados para uso clínico em muitas doenças e tentaram descobrir se havia algum que pudesse modificar os componentes da fase inicial da sépsis.
Estudados mais de 1300 compostos
"Estudámos mais de 1300 compostos e houve um grupo de fármacos, usado no tratamento do cancro, que se mostrou extraordinariamente eficaz para modificar a fase inflamatória da doença", contou na altura Ferreira Moita.
"É utilizado em doses muito diferentes na quimioterapia, mas no cancro mata as células neoplásticas (que têm um crescimento exagerado) e aqui no nosso laboratório, onde testámos este fármaco em ratinhos, pretendemos que faça sobreviver estas células, em particular nos órgãos que são em primeiro lugar afetados pela sépsis". A nova aplicação do fármaco já está patenteada em 140 países.
O teste foi feito em ratinhos com uma forma muito grave da sépsis, a peritonite aguda, que mata rapidamente. "Ficámos surpreendidos porque, mesmo sem o uso de antibióticos, este fármaco foi extremamente eficaz", salientou então o investigador. Pelo menos 80% dos ratinhos morrem ao fim de 48 horas, mas com o novo tratamento "mantiveram-se vivos ao longo de várias semanas".
Depois, o laboratório passou dois anos a perceber os mecanismos que justificavam a eficácia do fármaco. Agora chegou a fase do ensaio clínico, que vai ser feito no Hospital de Santa Maria em 2014.