19 março 2020 8:59
Tripulantes, técnicos e sindicato dizem ter “medo” de voar e de operar nas instalações da TAP e pedem medidas mais exigentes de prevenção. Companhia aérea garante que tudo está a ser feito para garantir a segurança de todos.
19 março 2020 8:59
Aviões por desinfetar, falta de equipamento de proteção (máscaras, luvas e gel desinfetante), equipas inteiras retidas no mesmo aparelho por largas dezenas de horas, falta de medidas de prevenção e uma sensação generalizada de insegurança. Em plena pandemia do novo coronavírus, continuam a chegar queixas de vários tripulantes da TAP alegando falta de condições mínimas para voar. A companhia aérea nega tudo, garante estar a seguir todas as recomendações das autoridades de saúde e reafirma: “Os nossos aviões são seguros”.
O Expresso teve acesso a vários testemunhos, alguns deles circulam nas redes sociais em grupos restritos de Facebook, e falou diretamente com tripulantes que se queixam de estarem excessivamente expostos ao surto. “Somos carne para canhão”, lamenta uma das comissária de bordo ouvidas pelo Expresso.
As queixas são múltiplas. Os tripulantes não terão luvas nem máscaras pessoais e, as que existem, estão no kit médico e só podem ser usadas em casos de emergência. Os aviões, alegam vários trabalhadores que viajaram nos últimos dias na TAP, além de cheios, não serão desinfetados entre viagens. No limite, são “aspirados e limpos na exata medida em que já o eram antes”, admite a mesma tripulante. E o pessoal de voo é obrigado a permanecer dentro do mesmo avião entre voos de longo curso, num “espaço fechado”. Alegações que a TAP desmente ou contextualiza. Mas já lá vamos.
“Numa rotação Lisboa-Londres-Lisboa, eu posso estar em contacto com mais de 120 pessoas. Se não ficar em quarentena, posso criar inúmeras cadeias de transmissão do vírus”, queixa-se ao Expresso outro comissário de bordo. E os problemas não se circunscrevem ao interior dos aparelhos. “Os balneários onde os técnicos se equipam não são desinfetados. Na cantina, já vi pessoas sem qualquer proteção a reporem os talheres. São coisas básicas”, conta um técnico de manutenção de aeronaves.
Os relatos não são novos. No sábado, o Expresso já dava conta das queixas do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) sobre as alegadas falhas de segurança sanitária na companhia aérea. Henrique Martins, presidente do sindicato, garante que nada mudou. “Estou a tentar resolver este assunto desde o dia 30 de janeiro e que ainda não há resultados. Não existem máscaras, nem luvas a bordo, o desinfetante escasseia, os trabalhadores não se sentem seguros para voar”.
Depois de ter sido noticiado pelo Expresso, no passado sábado, que a TAP não estaria a dar as devidas condições aos trabalhadores para fazerem frente à propagação do novo Coronavírus, o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) ainda não obteve uma resposta. Henrique Martins, presidente do sindicato, diz ao Expresso que “está a tentar resolver este assunto desde o dia 30 de janeiro e que ainda não há resultados. Não existem máscaras, nem luvas a bordo, o desinfetante escasseia, os trabalhadores não se sentem seguros para voar”.
TAP defende-se. Governo em silêncio
Ouvida pelo Expresso, a companhia aérea defende-se e, através de fonte oficial, diz estar “a informar cuidadosamente e em tempo real todos os seus trabalhadores e, em particular os tripulantes, sobre os procedimentos adequados e corretos relativamente ao novo Coronavírus, em consonância com as melhores práticas e procedimentos definidos, recomendados e impostos pelas autoridades de saúde nacionais e internacionais, nomeadamente a Direção-Geral de Saúde (DGS) e a Organização Mundial de Saúde (OMS)”.
Sobre o uso de máscaras, a companhia aérea suporta-se nas recomendações das autoridades de saúde para lembrar que o uso de máscaras não é aconselhado, “a não ser que haja uma suspeita de infeção” ou que se “esteja a prestar cuidados diretos a um infetado com o mesmo vírus”. Quanto às luvas, garante-se, “estão disponíveis a bordo para utilização durante todas as fases do voo no contato com os passageiros” - algo que as fontes consultadas pelo Expresso dizem não corresponder inteiramente à verdade.
O mesmo acontece em relação à desinfeção ou não dos aparelhos: a TAP garante que tudo está a ser feito nesse sentido. “Para além da rigorosa higiene e limpeza de rotina dos nossos aviões e espaços de trabalho, temos implementado procedimentos adicionais de limpeza e desinfeção específicos para o Coronavírus COVID-19, utilizando produtos biocidas homologados, em linha com as orientações da DGS, com as especificações de segurança aeronáutica e dos fabricantes dos nossos aviões. Os nossos aviões são seguros”, diz a companhia.
Mais se garante que o ambiente dentro de um avião é dos “menos propícios ao contágio de doenças infectocontagiosas onde qualquer pessoa pode estar”. A TAP assegura que a tecnologia de renovação do ar é fiável: “Todos os aviões da TAP estão equipados com um sistema de reciclagem do ar vertical que renova totalmente o ar da cabine com alta frequência, a cada 2/3 minutos, vinte vezes numa hora. Este sistema, vertical, funciona por secções de 5 filas de bancos o que garante ar fresco em todas as zonas do avião, ao mesmo tempo e com a mesma qualidade. Este sistema utiliza filtros HEPA (High Efficiency Particulate Air) idênticos aos utilizados nos blocos operatórios. Estes filtros conseguem extrair 99,999% dos vírus mesmo mais pequenos, incluindo vírus com apenas 0,01 micrómetro. Os vírus da família coronavírus têm uma dimensão entre 0,08 e 0,16 micrómetro, portanto prontamente filtrados pelos filtros HEPA, por seções e a cada 2/3 minutos.”
Há poucos dias, mais precisamente a 11 de março, Anabela Jorge, diretora da Unidade Cuidados de Saúde (UCS) do grupo TAP, reconheceu em declarações à SIC Notícias, que não havia sido colocada em quarentena a tripulação do voo que transportou uma pessoa infectada com o novo coronavírus, algo que vai contra as recomendações da DGS. O sindicato diz que está disposto a avançar para tribunal.
O Expresso procurou ainda obter uma posição do Ministério das Infraestruturas e Habitação, liderado por Pedro Nuno Santos e que tem a tutela direta da TAP, mas não teve qualquer resposta nesse sentido.