“Do ar que respiramos à comida que comemos, energia com que nos abastecemos e medicina com que nos curamos, as nossas vidas estão totalmente dependentes de ecossistemas saudáveis. No entanto, as nossas atividades são devastadoras em todos os cantos do planeta.”
O alerta é de António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas,que numa mensagem divulgada no Twitter sublinha a urgência. “Temos de pôr fim a esta guerra à natureza”.
No Dia Internacional da Diversidade Biológica, o Expresso reuniu alguns dados sobre as espécies de fauna e flora existentes no mundo e no país.
Existem 8.7 milhões de espécies no planeta (mas só conhecemos pouco mais de um décimo)
O mundo natural é constituído por uma enorme variedade de formas de vida. Há animais, plantas, fungos e outros tipos de organismos; de grandes dimensões ou invisíveis ao olho nu; aquáticos ou terrestres; há muito conhecidos ou recém descobertos.
Com tanta variedade, coloca-se a questão: sabemos realmente quantas espécies vivem no nosso planeta?
A comunidade científica fez a mesma pergunta e em 2011, uma equipa de investigadores da Universidade de Dalhousie (Canadá) estudou a questão.
A resposta: existem 8.7 milhões de espécies de fauna e flora no planeta.
Este número é, contudo, apenas uma estimativa. Isto porque, “apesar de 250 anos de classificação taxonómica e mais de 1,2 milhão de espécies já catalogadas num banco de dados central, os nossos resultados sugerem que cerca de 86% das espécies existentes na Terra e 91% das espécies no oceano ainda aguardam descrição”, salvaguardam.
Oceanos cobrem maioria do planeta (mas a esmagadora maioria das espécies conhecidas está em Terra)
Apesar do nome, 70% do planeta que habitamos está coberto por oceanos. A extensão de água é tal que, segundo a NOAA (Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA), 97% da água mundial está nos oceanos.
Embora reconhecida a sua importância - para a nossa alimentação, regulação do clima e para a produção da maioria do oxigénio que respiramos -, a verdade é que a UNESCO estima que apenas 5% dos oceanos foi explorado pelo ser humano.
Em termos de biodiversidade, são conhecidas 194.409 espécies marítimas. Estima-se contudo que possam ser 2.2 milhões.
Já em terra, são as florestas (que cobrem 30% da superfície terrestre) que concentram a maioria da biodiversidade (80%).
Um milhão de espécies estão em risco de extinção (e número vai continuar a aumentar)
Nas contas da biodiversidade, há contudo um número bem mais negro que se destaca.
Segundo um relatório da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos (IPBES) divulgado em 2019, cerca de um milhão estão em risco de extinção.
Mas as más notícias não ficam por aqui. O estudo conclui que as atividades humanas “ameaçam mais espécies agora do que nunca”, havendo razão para acreditar que cerca de um quarto estão vulneráveis.
O IPBES identifica cinco fatores-chave que contribuem para a perda da biodiversidade. São eles as alterações na utilização do mar e da terra, a exploração direta de organismos, as alterações climáticas, a poluição e as espécies não nativas invasoras.
Se nada for feito, espera-se uma “maior aceleração” na taxa global de extinção de espécies, que já é atualmente “pelo menos dezenas a centenas de vezes superior à média dos últimos 10 milhões de anos”, afirma o relatório.
E, dado o nível de desconhecimento, é possível (e até provável) que existam espécies que estão a desaparecer sem nunca terem sido conhecidas do ser humano.
Mais de dois terços das populações selvagens desapareceram nos últimos 50 anos
Os avisos do Painel Intergovernamental da ONU estão em linha com a realidade que tem sido registada pelo Índice Planeta Vivo no último meio século.
Os dados deste indicador de biodiversidade mostram que 69% das populações selvagens desapareceram desde 1970. Embora salvaguardando que este indicador é global, não representando as especificidades de cada espécie e região, a linha está inequivocamente em queda.
Evolução do Índice Planeta Vivo global
Espécies ameaçadas na Lista Vermelha do IUCN
Estes dados gerais escondem contudo variações específicas. É o caso dos mamíferos selvagens, cujas populações caíram 85% desde que a espécie humana começou a crescer (nos últimos 100 mil anos).
Atualmente, totalizam apenas 4% da biomassa mundial (valor que inclui tanto as espécies marinhas, como as terrestres). Em contrapartida, os outros 96% são humanos e gado (estes últimos sendo quase dois terços do total, dez vezes mais biomassa que espécies selvagens).
O desaparecimento não é contudo um caso irreversível. Um estudo publicado no ano passado revela que os esforços de conservação permitiram aumentar as populações de alguns mamíferos selvagens na Europa ao longo das últimas décadas.
Entre estes, o castor-europeu é o campeão da recuperação, com as populações a aumentarem 16.705% entre 1960 e 2016. Na lista, o lince ibérico surge em 16.º, com uma aumento da população de 252% desde 1987.
Portugal sem dados de conservação para quase um terço das espécies
A situação não deixa de ser preocupante na Europa, contudo. Segundo a Agência Europeia do Ambiente, dois terços das espécies protegidas sob a Diretiva Habitats (que visa promover a biodiversidade na UE) estão num estado “pobre ou mau de conservação”.
O “Estado da Natureza na Europa 2020” acrescenta que em Portugal, 26,77% das 437 espécies consideradas estão em bom estado de conservação. Outros 31,58% estão num estado pobre e 11,44% estão em mau estado. Faltam no entanto dados para 30,21% das espécies (o segundo maior buraco de conhecimento a nível europeu, apenas superado pela Croácia).
Entre as espécies mais ameaçadas em Portugal consta a foca-monge, o lince-ibérico, a águia-imperial o morcego-de-ferradura-mourisco e morcego-rato-grande.
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