O Sindicato dos Funcionários Judiciais denunciou esta sexta-feira uma violação da lei da greve no Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa, onde funcionários externos foram chamados a assegurar diligências em substituição de trabalhadores em greve, admitindo avançar com processo-crime.
Segundo a dirigente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) Regina Soares, a administradora judiciária da Comarca de Lisboa ordenou que fossem chamados funcionários judiciais do juízo Local Criminal para assegurar, no juízo de instrução criminal, “um serviço materialmente diferente”, dois interrogatórios a dois detidos e que tinham o prazo de 48 horas para serem ouvidos em primeiro interrogatório judicial a expirar até ao final do dia de hoje.
Ao Expresso, esta dirigente sindical lembra que esta é a “primeira vez” que uma coisa destas acontece e que fere “o âmago do sentido de uma greve”.
“A lei proíbe, constitui uma contraordenação grave e até um processo-crime por violação da lei da greve, o facto de se irem buscar trabalhadores que não estão em greve para serviços diferentes do que eles realizam no dia-a-dia para colmatar falhas nos serviços de colegas que estão em greve, que é o que se passa aqui. Todos os colegas do ‘Ticão’ [Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa] estão em greve”, disse à Lusa Regina Soares.
Os dois funcionários requisitados não tinham aderido à greve.
A dirigente sindical recordou que existe um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que estipula que, em greves de 24 horas, os funcionários judiciais não ficam sujeitos a serviços mínimos, sublinhando que o que motivou o caso de hoje nunca seria um problema imputável a uma greve de 24 horas, uma vez que o prazo de 48 horas daria margem para que os detidos fossem ouvidos em tribunal.
Defendendo que os funcionários judiciais são “uma classe bastante consciente”, recusou, no entanto, que possa recair sobre estes trabalhadores a responsabilidade de garantir o cumprimento de prazos judiciais, sendo da competência do Ministério Público e dos órgãos de polícias criminal a gestão das 48 horas até primeiro interrogatório para aplicação de medidas de coação pelo juiz de instrução e evitar, eventualmente, a fuga dos detidos.
Perante aquilo que considera uma violação da lei da greve, o SFJ pondera na segunda-feira avançar com um processo-crime, contestando um “atropelo à lei” de um despacho da administradora judiciária da Comarca de Lisboa que ordenou “o transporte de funcionários judiciais de um lado para o outro”, de serviços diferentes.
Pelas 17h30 estava para ter início o segundo interrogatório que decorreu ontem, que não se iniciou mais cedo porque o advogado de defesa pediu para consultar o processo, e que não tinha qualquer previsão para terminar.
Segundo o Expresso conseguiu apurar, os dois detidos são um homem e uma mulher. Ele é suspeito num caso de crime económico e ela num de lenocínio. Nenhum terá ficado em prisão preventiva. A lei obriga a que sejam presentes a um juiz num prazo máximo de 48 horas, senão terão de ser libertados. Regina Soares admite que é um caso “complicado” mas argumenta que a greve estava anunciada “há muito tempo” e que devia ter havido “melhor gestão do processo”.
Regina Soares criticou ainda o facto de a decisão da administração judiciária ter eliminado os efeitos práticos da greve, que foi total no ‘Ticão’, com todos os 20 funcionários a aderir à paralisação, e de comprometer o sacrifício da perda de remuneração de um dia de trabalho.
A adesão à greve nacional da função pública registou uma adesão da ordem dos 80%, com escolas fechadas, centros hospitalares a funcionar em mínimos e serviços de atendimento ao público encerrados, segundo o balanço global da Frente Comum.
A greve nacional decorre a uma semana da votação final global da proposta de Orçamento do Estado para 2023 (OE2023), que prevê aumentos salariais de um mínimo de cerca de 52 euros ou de 2% para a administração pública no próximo ano.
A Frente Comum de Sindicatos, que não subscreveu o acordo assinado em outubro entre o Governo e as duas estruturas da UGT, a Fesap e o STE, exige aumentos salariais de 10% ou um mínimo de 100 euros para a administração pública no próximo ano e acredita que ainda há tempo para negociar com o executivo.
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