O secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, Miguel Alves, visitou esta manhã Luís Dias, o agricultor que estava em protesto de greve de fome há um mês em frente ao Palácio de São Bento, e prometeu em nome do primeiro-ministro encontrar uma solução para o diferendo entre o agricultor e o Estado sobre o financiamento da Quinta das Amoras – um caso que já se arrasta há oito anos.
“O secretário de Estado, recém-empossado no cargo, mostrou-se empenhado em inteirar-se do assunto e contribuir para uma solução mediada”, escreveu Luís Dias na sua conta pessoal do Twitter, no mesmo texto em que anuncia o fim do protesto em frente à residência oficial de António Costa: “Mesmo nos dias mais sombrios, a esperança é a última a morrer e é em nome dessa esperança que hoje interrompo a greve de fome iniciada a 8 de setembro passado.”
Assim, governante e agricultor combinaram reunir-se já na próxima segunda-feira. “O compromisso pessoal do secretário de Estado Miguel Alves não é ainda a solução do problema, mas é garantia da possibilidade de mediação, que foi acordada em janeiro, possa mesmo avançar”, sublinha Luís Dias, que foi hospitalizado duas vezes durante esta greve de fome, a última das quais esta semana, tal como o Expresso noticiou esta quinta-feira.
Na semana passada, António Costa foi confrontado com o caso pelo deputado Rui Tavares durante um debate parlamentar: “o senhor não tem razão, é muito simples”, e por isso o Governo “não tem nada a fazer para responder a essa situação", afirmou, depois de o seu gabinete ter garantindo várias vezes desde o início do processo “toda a disponibilidade” do executivo para encontrar uma solução.
“Ele [o secretário de Estado] pareceu-me sincero. Vale o que vale. Pediu tempo para se poder inteirar de tudo sem a pressão de me acontecer qualquer coisa. Na segunda-feira reunimos. E acho que ficou claro que nós só queremos que isto acabe e podermos retomar uma vida normal”, disse há minutos Luís Dias ao Expresso, sublinhando que “espera que isto acabe de vez”.
Esta é a terceira greve de fome iniciada por Luís Dias desde maio de 2021 – a primeira das quais à frente do Palácio de Belém, terminada após um apelo direto de Marcelo Rebelo de Sousa. A segunda foi levada a cabo já em São Bento, em janeiro, e terminou depois do primeiro-ministro garantir que o problema seria resolvido – algo que até agora ainda não aconteceu.
O que está em causa?
Em causa está um diferendo entre o agricultor e o Estado que remonta a 2014. Luís Dias e a ex-companheira Maria José Santos fixaram-se na freguesia de Zebreira (Idanha-a-Nova) e candidataram-se ao programa Jovens Agricultores para começar uma exploração de amoras. Para receberem o apoio previsto no programa, foi-lhes solicitada uma garantia bancária – uma exigência que não constava das regras do concurso.
Os agricultores reclamaram da decisão junto da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro (DRAPC), sem sucesso. A exigência da garantia bancária “paralisou” a exploração até novembro de 2017, altura em que o Estado acedeu a pagar 220 mil euros dos 280 mil anteriormente aprovados para o projeto, cerca de 18 meses depois do pedido inicial.
Três semanas depois, as 54 estufas de amoras foram destruídas pela tempestade Ana. E a segunda parte do conflito começou: desta vez, a DRAPC recusou pagar o “Restabelecimento do Potencial Produtivo”, um apoio atribuído a explorações agrícolas afetadas por calamidades naturais ou acidentes climáticos adversos.
Com a quinta destruída e sem o investimento recuperado, Luís Dias e Maria José Santos acabaram por avançar para tribunal em janeiro de 2019. Em maio, o Ministério da Agricultura reconheceu que a Quinta das Amoras tinha de facto passado por um acidente climático adverso, e desbloqueou um segundo apoio no valor de 140 mil euros – que, no entanto, nunca chegou a ser pago pelo Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAP).
O Ministério Público e um relatório da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMOT) já deram razão a Luís Dias, apontando “desconformidades legais” à atuação do Estado. Por iniciativa dos queixosos, o caso está neste momento a ser apreciado no Tribunal Administrativo de Lisboa.
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