A anatomia não é estranha a André Castro, estudante da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, mas "ver ao vivo verdadeiramente o coração de um rei", iluminado numa vitrina de vidro ao fundo de uma sala mergulhada na meia-luz, suscita uma espécie de espanto desconhecido. O coração de D. Pedro IV, imerso em fermol, empalideceu e expandiu-se, o que salta à vista do observador. "Parece que está um pouco dilatado, está um bocadinho volumoso demais, não sei se será de uma patologia que D. Pedro tinha ou se do peso dos 200 anos que tem em cima", comenta o portuense de 32 anos.
D. Pedro IV, em Portugal, primeiro, para o Brasil, morreu, segundo uma autópsia realizada no Porto, com um dos pulmões colapsado. Em testamento, deixou à cidade que amava um "tesouro incalculável", nota André Castro. Não é todos os dias que se pode ver de perto um órgão de um rei, e logo aquele que, carregado de misticismo, tem sido descrito, ao longo dos séculos, como o que impele a ação e é depósito vivo de grandes paixões. "Muita gente não sabia que tínhamos este coração guardado no Porto. No brasão de armas da cidade, está representada a Nossa Senhora da Vandoma, o escudo de Portugal e, no centro, um coração que muita gente pensa que é metafórico. Não é, é real. Está aqui!"
Está bem à frente dos olhos do pequeno Tito Pena, de oito anos, da irmã, Clara, de 17, e da mãe, Joana André, que os leva a "ver pela primeira vez o coração de um lutador pela independência, pela liberdade e que está ligado à História dos dois lados do Atlântico". A matriarca, de 44 anos, não organizou a visita por mero 'voyeurismo', mas porque acredita que a iniciativa da Câmara Municipal do Porto, de abrir a exposição ao público, é um despertador para outras possibilidades e perspetivas de vida. "Temos de saber contar e recontar a história das colónias, no sentido de integrar. Temos de pensar, mais do que em independência, em convivência, porque a independência não pode ser uma coisa vazia, tem de ser integrativa."
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