A eutanásia em oito perguntas e respostas: não tinha já sido aprovada? O que acontece a seguir? Pode haver referendo?
Caitlin O'Hara
A lei que prevê a despenalização da morte medicamente assistida vai ser votada esta quinta-feira no Parlamento pela terceira vez, depois de Tribunal Constitucional e Presidente da República terem colocado em causa a linguagem escolhida pelos deputados em dois momentos diferentes
É hoje discutida pela terceira vez na Assembleia da República a chamada Lei da Eutanásia, que pretende legalizar a morte medicamente assistida.
A eutanásia já não tinha sido aprovada no Parlamento?
Sim. A lei foi aprovada pela primeira vez em janeiro de 2021, mas Marcelo Rebelo de Sousa enviou o documento para o Tribunal Constitucional, que considerou “imprecisas” expressões como “lesão definitiva de gravidade extrema”. O assunto voltou a ser discutido na AR, que em novembro aprovou uma nova versão com esta alteração: "Por decisão da própria pessoa (...) com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença incurável e fatal".
Marcelo questionou ainda se a retirada do conceito “doença fatal” não corresponderia a uma “solução radical”, semelhante à praticada em outros países europeus, e pediu ao Parlamento para apurar se essa solução seria representativa do pensamento da sociedade portuguesa.
Em resposta ao veto de Marcelo, PS, BE, IL e PAN chegaram a acordo para retirar a expressão “doença fatal” como uma das condições para levar a cabo a morte medicamente assistida. O texto prevê que seja preciso sofrer uma “lesão definitiva de gravidade extrema” ou uma “doença grave e incurável”.
“Uniformizámos todas as definições, em resposta ao TC, e em resposta ao veto do Presidente da República, especificamos agora que para a morte medicamente assistida não se exige ‘doença grave ou incurável’, mas sim ‘doença grave e incurável’”, explica ao Expresso a deputada socialista, Isabel Moreira.
BE, IL e PAN também concordam que as mudanças respondem às dúvidas de Marcelo, e que estão “reunidas condições” para aprovar o diploma “sem reservas”.
O que é que diz agora o Presidente da República?
Marcelo já garantiu que não vai decidir com base nas suas convicções pessoais (é contra), mas também não afasta a possibilidade de vetar o diploma mais uma vez. “Tenho de ver a lei”, disse por estes dias.
A Presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) não percebe a “urgência” em aprovar o diploma: “A sociedade portuguesa tem outras matérias absolutamente prioritárias”, disse ao Expresso esta semana. Maria do Céu Patrão Neves lamenta que não tenha sido feita uma “revisão ampla” do diploma.
A Federação Pró-Vida sublinha que "não é possível fazer uma lei boa para um ato errado”, e marcou para hoje seis manifestações contra a aprovação do diploma: Braga, Coimbra, Porto, Aveiro, e Lisboa.
Ainda é possível a eutanásia ser alvo de referendo?
É improvável, dado que o PS é contra essa solução e tem maioria absoluta no Parlamento. “Esta é uma matéria de direitos fundamentais. Somos absolutamente contra o referendo de matérias como estas”, disse hoje Isabel Moreira.
O que pode acontecer agora?
Se a lei for aprovada, segue-se a discussão na especialidade. Nem toda a regulamentação do processo está decidida: a IL defende, por exemplo, que a atribuição dos médicos que participem na eutanásia de doentes seja feita por sorteio, uma ideia à qual PS e BE mostram reservas.
Só depois é que Belém será chamado a pronunciar-se. O Presidente da República terá outra vez várias opções diferentes caso o documento seja aprovado (como é esperado): vetar a lei e devolvê-la à AR, enviá-la novamente para o TC ou promulgar.
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