18 fevereiro 2022 12:18
Ângela Barreto conheceu a decisão do tribunal de Roterdão esta sexta-feira. MP tinha pedido seis anos de prisão
18 fevereiro 2022 12:18
A jiadista Ângela Barreto foi condenada a quatro anos e seis meses de prisão esta sexta-feira no tribunal de Roterdão, nos Países Baixos, por participação em organização terrorista e preparação e promoção de crimes terroristas. O juiz descontou já o tempo que a luso-holandesa esteve em prisão preventiva nos Países Baixos.
Pelo contrário, o tempo que Ângela Barreto passou no campo de detenção na Síria para mulheres e filhos de jiadistas não foi tido em conta para a formulação desta sentença. “O tempo que a suspeita passou detida no campo al-Hawl, na Síria, e na Turquia não é levado em consideração. Embora a permanência no campo tenha sido muito difícil, o tribunal não vê razão para isso.”
Recorde-se que o Ministério Público tinha pedido há duas semanas seis anos de prisão durante as alegações finais do julgamento.
Esta sexta-feira, o tribunal recordou que Ângela Barreto viajou para a Síria em agosto de 2014 e se estabeleceu no autoproclamado califado do Daesh. Durante sua permanência na Síria, que durou até o final de novembro de 2020, a luso-holandesa casou-se com três homens, entre eles os jiadistas portugueses Fábio Poças e Nero Saraiva. “Ela apoiou o seu primeiro e terceiro maridos. Ambos eram ativos em um grupo de atiradores do Daesh. Além disso, a suspeita fazia propaganda para o Daesh e possuía armas de fogo durante esse período. Além disso, a suspeita permaneceu na Síria até depois da queda do califado.”
O magistrado levou no entanto em consideração “a responsabilidade reduzida da acusada”. Especialistas ouvidos no tribunal de Roterdão revelaram que “os factos e circunstâncias que levaram à saída da suspeita para a Síria são menos atribuíveis a ela, em função da crescente ingenuidade e influência da suspeita durante esse período”.
À arguida também será imposta uma medida pelo tribunal para controlar o seu comportamento. “A mulher é sensível às influências dos outros, especialmente do parceiro, e parece motivada a enfrentar os seus padrões disfuncionais”, refere o tribunal.
Foi revelado em tribunal que Ângela Barreto se converteu ao Islão em novembro de 2013, meses antes de rumar para a Síria, em agosto de 2014.
Ângela, “a vítima” do Daesh
Jeffrey Jordan, advogado da luso-holandesa, que se encontra detida desde o início do ano passado na única prisão dos Países Baixos para mulheres suspeitas de terrorismo, disse à SIC esta semana: “Ela diz que merece um castigo e quer um veredicto honesto.”
O advogado garantiu que a jiadista lhe confidenciou que foi “forçada” a juntar-se àquela organização terrorista quando se encontrava no autodenominado califado. “Foi para a Síria sem saber para o que ia e quando descobriu já era tarde demais. Se fosse contra o Daesh, seria morta.”
Jeffrey Jordan negou, todavia, que a luso-holandesa se esteja a vitimizar e salienta que ela tentou fugir várias vezes, mas houve sempre algo que correu mal. “Ângela precisava de dinheiro, mas não tinha, e era difícil de fugir dali.” E está convicto de que a mulher, de 26 anos não representa ameaça e já provou que “é uma grande mãe” e “uma vítima” do Daesh. “Ela não testemunhou execuções.”
Seis anos depois de ter fugido de casa, a luso-holandesa disse estar arrependida de ter deixado o seu país, a família e sobretudo a mãe. “Está envergonhada de se ter juntado ao Daesh.”
Ângela, “a recrutadora” do Daesh
Há duas semanas, em tribunal, o procurador do MP frisou que não acredita na versão de Ângela Barreto e disse que a jiadista está a fingir passar a imagem de uma jovem ingénua. Na verdade, a luso-holandesa teria sido “uma verdadeira mulher do Daesh”, que apoiou os três maridos, combatentes dos terroristas. E mais: teria tentado, através das redes sociais, recrutar três raparigas dos Países Baixos para se juntarem ao Daesh na Síria. “Ela contribuiu para a morte de muitas vítimas, que foram brutalmente assassinadas. Ela permaneceu no califado até ao último suspiro”, disse o procurador dos Países Baixos.
O MP lembrou que Nero Saraiva, um dos maridos da jiadista, chegou a executar prisioneiros. “Ângela tinha uma arma de fogo própria, uma AK-47. Ela própria vendeu granadas. E chegou a escrever à sua mãe que estava a lutar pela liberdade e não tinha qualquer intenção de parar.” Para o procurador, a mulher fazia parte de uma organização “assassina e implacável” — e não há nada que demonstre que ela se tenha distanciado ou arrependido.
O caso de Ângela Barreto não é único nos Países Baixos. No início do mês, as autoridades repatriaram da Síria cinco mulheres, com 11 filhos.