O Tribunal da Relação de Lisboa condenou hoje os três inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) envolvidos na morte do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk a uma pena de nove anos de prisão.
Esta decisão da Relação manteve a pena dos inspetores Duarte Laja e Luís Silva, e aumentou a pena de prisão aplicada ao inspetor Bruno Sousa, condenado em maio pelo Tribunal Criminal de Lisboa a uma pena de sete anos pelo crime de ofensa à integridade física grave qualificada, agravada pelo resultado (morte).
Contactado pela Lusa, o advogado da família do cidadão ucraniano morto em março de 2020 no aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, José Gaspar Schwalbach considerou "positivo o facto de a Relação de Lisboa ter equiparado a responsabilidade a todos os arguidos", aplicando aos três a mesma duração de pena (nove anos).
Não há "diferença de culpa"
O Tribunal da Relação de Lisboa considerou não existir diferença de culpa entre os três inspetores do SEF envolvidos na morte do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk. Segundo o acórdão da Relação a que a Lusa teve acesso, não se vislumbra "essa diferença de culpa, nem que a condição pessoal do arguido Bruno Sousa se mostre mais especificamente atenuativa do que a dos restantes", lembrando ainda o passado deste inspetor no exercício de advocacia e ao serviço da Polícia Marítima antes de integrar o SEF.
"Não estamos perante alguém que, acompanhando colegas mais velhos e de maior experiência, sentisse intimidação ou temor reverencial, que o condicionasse a fazer o que os outros lhe mandavam. Tinha este arguido, de facto, a formação e a experiência profissional que lhe permitiam, caso a iniciativa da agressão tivesse cabido aos outros dois arguidos (o que não se mostra sequer provado), fazer frente a tal iniciativa e opor-se à mesma, assim o tivesse querido. Bastaria que tivesse saído da sala dos médicos, como primeiro passo", pode ler-se no documento.
Ao equiparar a pena de prisão de nove anos aos três arguidos, o tribunal deu razão parcial ao Ministério Público (MP) e à família de Ihor Homeniuk enquanto assistente no processo, que tinham pedido o agravamento da pena imposta ao inspetor Bruno Sousa. Contudo, não validou o pedido de agravamento do MP e da família para os outros dois arguidos. Os recursos apresentados pelos arguidos, que solicitavam o desagravamento das penas de prisão impostas em primeira instância, também não foram atendidos.
No acórdão, as juízas desembargadora Maria Margarida Almeida (relatora) e Ana Paramés salientaram que a atuação dos arguidos se enquadrou no "patamar da negligência inconsciente", reconhecendo que os arguidos não queriam a morte de Ihor Homeniuk, mas que esta se verificou porque, "levianamente, não consideraram que da sua atuação, esse resultado pudesse vir a ocorrer e, portanto, não tomaram as providências necessárias a evitá-lo".
As juízas censuraram também a atuação de vigilantes presentes no Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT) e das chefias do SEF presentes no aeroporto de Lisboa. O acórdão vinca "a vista grossa que quase uma dezena de pessoas fizeram ao que se estava a passar, a falta de coragem de assumirem qualquer tipo de iniciativa, a ausência de empatia e o egoísmo que revelaram".
Arguidos vão recorrer para o Supremo
Os advogados dos inspetores do SEF afirmaram que vão recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça da condenação aplicada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
"Vamos recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça [STJ], confiados em que ainda podemos alterar os termos da condenação", afirmou Ricardo Sá Fernandes, advogado do arguido Bruno Sousa. "A subida da pena é um elemento negativo, mas, ironicamente, do ponto de vista processual, vai permitir-lhe recorrer para o STJ, o que com uma pena de sete anos não seria possível".
Ricardo Serrano Vieira, advogado do inspector Duarte Laja, disse que irá agora "analisar os fundamentos para a rejeição dos recursos interpostos pela defesa" e recorrer da decisão para o STJ.
Maria Manuel Candal, advogada de Luís Silva, assegurou que vai "recorrer com toda a certeza", embora tenha assumido que ainda não teve oportunidade de analisar "com a atenção e o cuidado devido" o teor das "mais de 300 páginas de acórdão". A defesa tem agora um prazo de 30 dias para a apresentação de novo recurso.
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