Exclusivo

Sociedade

“Temos medo.” Comunidade ucraniana exige que Medina lhes garanta que não enviou dados pessoais para a Rússia (e pondera uma queixa-crime)

O presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina
O presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina
TIAGO MIRANDA

Desde o final de 2013 têm sido realizados protestos em frente à embaixada russa em Lisboa por parte da comunidade ucraniana residente em Portugal. Caso se confirme o envio de dados pessoais de ativistas ucranianos para a Rússia, a associação pondera avançar com uma queixa-crime contra a autarquia

A Associação dos Ucranianos em Portugal enviou no final da semana passada um email ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, a exigir que a autarquia lhes dê garantias que os dados pessoais de organizadores de manifestações convocadas em frente à embaixada da Rússia não tenham sido reenviadas para aquele país.

O email a que o Expresso teve acesso foi enviado em reação às notícias avançadas pelo Expresso e "Observador" na última quarta-feira que os dados pessoais de três ativistas russos residentes em Portugal, que organizaram uma manifestação em frente à embaixada daquele país a 23 de janeiro de 2021 pedindo a libertação do ativista Alexei Navalny, foram enviados dos serviços da autarquia de Lisboa para a embaixada russa em Portugal, mas também para o Ministério dos Negócios Estrangeiros em Moscovo.

"Presidente da Câmara municipal de Lisboa
O Sr. Fernando Medina Maciel Almeida Correia

Devido à notícia sobre a revelação dos dados pessoais dos organizadores das manifestações em frente à embaixada russa em Lisboa, exigimos garantias que o mesmo não será feito com os cidadãos ucranianos que organizaram em Lisboa numerosas manifestações contra agressão russa e contra a anexação da Crimeia", escreveu Pavlo Sadokha, presidente da Associação dos Ucranianos em Portugal.

Ao Expresso, Pavlo Sadokha lembra que, desde o final de 2013, a associação tem organizado dezenas de protestos não só em frente à embaixada da Rússia como também à dos Estados Unidos e Reino Unido. "Uma pessoa da Câmara Municipal de Lisboa ligou-nos posteriormente ao envio do nosso email a dizer que a autarquia iria investigar os procedimentos feitos na altura com os nossos pedidos para manifestações."

O dirigente ucraniano revela que sempre que é feito um pedido para a autarquia a informar de uma manifestação, é enviado o número de pessoas esperadas no protesto, o motivo desse protesto e quem são os organizadores do mesmo. "Sabíamos que esses dados eram reenviados para a PSP mas desconhecíamos que eram também passados para outros países."

Caso a autarquia lhes confirme que reenviou os dados pessoais de ativistas para a Rússia, como fez no caso dos três ativistas russos em janeiro, a associação pondera fazer uma queixa-crime ao Ministério Público. "A confirmar-se é algo de muito grave", enfatiza.

Pavlo Sadokha lembra que há ativistas ucranianos que se têm mostrado contra a invasão russa do território da Crimeia a viver em Portugal que já foram ameaçados nas redes sociais. "Se eles ficam a saber das nossas moradas pode ser muito problemático. Temos medo que algo lhes possa acontecer." Também vivem em Portugal pessoas da Crimeia com familiares na "Crimeia ocupada pelos russos" e que "podem por isso sofrer represálias".

O próprio Pavlo Sadokha refere que já foi alvo de ameaças por parte de cidadãos russos e que chegou a fazer queixa disso na PSP. "Mas foi tudo arquivado".

Recorde-se que a invasão russa da Crimeia deu-se em fevereiro de 2014 e desde então tem havido grande tensão política e militar entre a Ucrânia e a Rússia.

Na sequência das notícias, Fernando Medina admitiu que está em causa um "erro lamentável" e garante que apresentou um pedido de desculpas aos promotores da manifestação de janeiro, em Lisboa, que pedia a libertação de Alexei Navalny. O autarca garantiu que foram alterados, em abril, os procedimentos neste âmbito e promete ainda mais alterações aos procedimentos para evitar situações semelhantes no futuro.

Em entrevista à RTP, revelou que pediu uma auditoria interna na câmara para perceber se houve registo de casos semelhantes de partilha indevida de dados com a diplomacia de países estrangeiros.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: HFranco@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas