2 setembro 2022 21:14

O mundo do design, revelado semanalmente por Guta Moura Guedes
2 setembro 2022 21:14
Lembro-me de ser miúda e de passar os últimos dias de Agosto e os primeiríssimos dias de Setembro acompanhada por um bloco de notas, daqueles bem pequenos, os que cabiam no bolso de trás das calças e que víamos, eu via, pelo menos, nas mãos ágeis dos marceneiros ou de quem me atendia nas drogarias. Sempre blocos de linhas, que a mim nunca me assistiu a faculdade do desenho à mão livre. As linhas ajudavam-me a estruturar o gesto, o suficiente, e davam-me a liberdade que o papel quadriculado não tinha. Nesses blocos rabiscava o que iria ser o próximo ano, com detalhes minuciosos, que iam desde listas de desejos e decisões até figurinos de como me iria vestir para ir à escola ou de esquissos de como iria organizar o espaço de estudo ou das várias encenações e produções que queria fazer. Sem querer, e sem saber, usava os princípios básicos do design. Ao longo daquelas folhas, depois da criação mental, ia passando para o papel, de forma mais ou menos desenhada, codificada mas inteligível, todo um percurso, toda uma série de modelos e propostas, que, acreditava, me iriam levar até uma lista de objectivos que tinha definido. Não o fazia em Dezembro, para iniciar em Janeiro — para mim o ano reiniciava-se em Setembro e esse era, e é, o meu mês favorito.
Setembro é hoje em dia marcado por uma série de eventos de design, de arte, de arquitectura, de música e de cultura em geral. É o mês da rentrée. O mundo dá sinal desse recomeço em várias cidades e há uma espécie de animação cosmopolita, um regresso energizado de quem conseguiu fazer férias, um regresso estimulante aos pontos de encontro públicos, maioritariamente em centros urbanos. É um mês extenso, que ultrapassa os seus determinados 30 dias, que agora já não são suficientes para um mundo tão grande e tão global, extravasando-se para Outubro e mesmo Novembro. Os museus renovam as suas exposições e programação e alguns eventos mais longos, como a Bienal de arte ou de arquitectura de Veneza, deixam as portas abertas e a programação incólume para que as possamos visitar com mais calma e com menos gente. É o mês em que regressamos à troca de ideias e projectos, com uma visível sede de reencontro. É um mês de transição sinérgica, quer nos resultados quer na determinação do início do que vai acontecer. Muita da produção em fábricas e em pequenos estúdios artesanais é retomada, as ideias esquissadas durante o calor podem finalmente começar a ser concretizadas. A máquina espreguiça-se e recomeça, passamos do desenho para a acção, que significa também, e no entanto, saber ouvir e ver de novo. É tempo de pôr o pé na estrada.