A 17ª edição do Festival Internacional dos Açores realiza-se este ano em São Miguel e na Terceira, e está dedicada ao centenário de nascimento de José Saramago, para quem o violoncelo era o instrumento de eleição
O ano passado, mais ou menos por estes dias, renascia um festival que hibernava há nove anos. A última edição tinha acontecido em 2012 e sucedeu-se uma paragem, porque o então pianista e diretor, Adriano Jordão, foi nomeado conselheiro cultural em Brasília. Desde 1984 que estava ligado umbilicalmente a este evento, o único que se atreveu a plantar concertos de música clássica nos Açores, na altura graças à iniciativa de Jorge Forjaz, aquele que era, na altura, secretário de cultura das ilhas. A primeira edição teve a soprano Teresa Berganza como cabeça de cartaz, e as seguintes não prescindiram de manter essa bitola: Alicia de Larrocha, Moura Lympany, Ileana Cotrubas, Lella Cuberli, Sandor Végh, Ingrid Haebler, António Meneses e Maurice Bourg foram presenças constantes.
Agora, após uma 16ª edição dedicada a Heitor Villa-Lobos — de quem se descobriram origens no Faial — surge a 17ª, entre 30 de agosto e 4 de setembro, consagrada ao centenário do nascimento de José Saramago. Isto porque “além da literatura, o escritor tinha outras duas paixões: a música e o violoncelo”, conta ao Expresso o diretor artístico do Festival Internacional dos Açores (FIA). Tiago Nunes recorda que este instrumento surge várias vezes na obra do Nobel português, como é o caso do livro “As Intermitências da Morte”.
De resto, dos oito concertos que fazem parte do programa do Festival, distribuídos entre São Miguel e a ilha Terceira, três são dedicados ao violoncelo, incluindo o da abertura, que, a 30 de agosto às 19h, no Palácio dos Capitães-Gerais, em Angra do Heroísmo, junta o pianista Adriano Jordão ao violoncelista russo Pavel Gomziakov para uma viagem por peças de Schubert e Liszt.
A 31, a mesma formação de câmara muda de intérpretes, com a violoncelista Isabel Vaz e o pianista Vasco Dantas a tocarem, também em Angra (no Centro Cultural e de Congressos, às 19h), Schumann, Granados e Rachmaninov. A 1 de setembro, é Pavel Gomziakov sozinho quem homenageia Saramago, com o seu violoncelo datado de 1703, percorrendo J.S. Bach, Prokofiev e Eugène Ysaÿe no Palácio de Sant'Ana, em Ponta Delgada. O público que estiver na Terceira poderá assistir, nesse mesmo dia e hora, a um recital de Adriano Jordão no qual o pianista discípulo de Helena Sá e Costa irá abordar tanto compositores do cânone musical — Debussy e Beethoven — quanto contemporâneos — Armando José Fernandes e Anne Victorino d'Almeida.
Tirando a referência a Saramago, o Festival “não tem propriamente uma temática”, especifica Tiago Nunes. E a razão reside no facto de, desde sempre, o objetivo ter sido “trazer nomes e repertório que não são habituais nesta comunidade”. É por isso que, no programa, surgem músicos como a pianista sul-coreana Young-Choon Park, que será recebida no Teatro Micaelense de Ponta Delgada para tocar Haydn, Schubert e três sonatas de Beethoven. Ou que, no dia 3, no mesmo espaço, é esperado o pianista Zoran Imsirovic, nascido na antiga Jugoslávia, para apresentar Schumann, Scriabin e a mais difícil sonata Schubert.
Ou que, como triunfo final, a encerrar o FIA, a grande pianista turca Gülsin Onay, vencedora de vários concursos internacionais e embaixadora da boa vontade da Unicef (organismo a favor do qual revertem os bilhetes), subirá ao palco do Micaelense para, após uma introdução composta por Haydn e Mendelssohn, espraiar sabedoria sobre o compositor no qual se especializou, ganhando a medalha de Estado do Governo polaco — Chopin.
De referir o único recital que decorre numa igreja (a de S. José, em Ponta Delgada), a 2 de setembro, por se tratar da única aproximação ao órgão, instrumento com tradição nos Açores, pela mão do organista João Santos.
Durante os seis dias de duração, e dos oito concertos propostos, cinco são de entrada gratuita. E todos contam com uma introdução didática de André Cunha Leal. O FIA oferece igualmente algumas atividades paralelas, tanto de caráter turístico (passeios, avistamento de cetáceos) como masterclasses que os músicos convidados irão ministrar para professores e alunos dos Conservatórios.
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