11 novembro 2022 12:01

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Quase 40 anos após a primeira edição, reencontramos a “Obra Poética” de José Afonso. A procura constante de outros espaços que nunca são aqui de um homem “em permanente atrito com o seu tempo”
11 novembro 2022 12:01
Em 1983, no ano em que foi lançado o que seria o seu penúltimo disco (“Como se Fora Seu Filho”) e em que se apresentou ao vivo pela última vez, em concertos nos Coliseus de Lisboa e Porto, José Afonso viu publicado em livro os seus “Textos e Canções” (Assírio & Alvim). Já bastante debilitado pela esclerose lateral amiotrófica, que o obrigaria a entregar grande parte da interpretação do álbum final (“Galinhas do Mato”, 1985) ao seu grupo de amigos mais chegados (José Mário Branco, Sérgio Godinho, Fausto, Júlio Pereira, Né Ladeiras, entre outros), Zeca ainda orientou J. H. Santos Barros na organização da sua obra dispersa, mais de metade da qual composta por poemas que não tinham como destino transformarem-se em canções. Essa outra escrita do cantautor fora publicada em revistas, ou estava espalhada por folhas soltas, e encontrou o seu lugar, de direito próprio, entre os núcleos já conhecidos a partir da discografia.
Nas edições revistas de 1988 e 2002, levadas a cabo por uma investigadora da obra de José Afonso, Elfriede Engelmayer, foram introduzidos novos poemas e pequenas correções. O mesmo acontece nesta quarta edição, que mantém a estrutura assente na ordem cronológica, com uma parte final dedicada às ‘Quadras Populares’, e a junção de quatro poemas inéditos em livro, escritos nos anos 50 e 60. Um deles, em prosa, começa assim: “Posso desviar a atenção da chuva mas não posso desviá-la de mim. Posso perder uma fortuna em tudo o que o meu olhar lobriga: morangos, o Fédon de Platão, crimes. A velha pátria espera o grão de trigo que a transformará em estância frutífera se também as crianças vierem reverdecê-la. De tudo o que nos ocupa é o silêncio que nos faz irmãos da morte.”