5 setembro 2022 2:08

Poemas de João Miguel Fernandes Jorge para 20 filmes de Yasujiro Ozu. Um estilo transcendental
5 setembro 2022 2:08
Os poemas de “Ervas”, que “enviam em proximidade e distância” para 20 filmes de Yasujiro Ozu, suscitam de imediato duas observações. A primeira, de âmbito mais restrito, tem a ver com livros anteriores de João Miguel Fernandes Jorge que partiam da obra de Carl Dreyer (“A Palavra”, 2007) e Robert Bresson (“Pickpocket”, 2009), os outros mestres de um “estilo transcendental no cinema” teorizado há meio século por Paul Schrader. Uma segunda observação, de ordem geral, é que toda a poesia de Fernandes Jorge parece existir “em proximidade e distância” com um objecto, seja esse objecto uma obra de arte, a geografia portuguesa, a História ou a autobiografia.
“Transcendental” e com inúmeros “envios”, esta estética adequa-se na perfeição a um realizador tão austero e indirecto como o autor de “Viagem a Tóquio” (um elogio é devido à extrema elegância desta edição, com desenhos de Rui Vasconcelos e desenho gráfico de Rita Azevedo Gomes). Se os poemas usam motivos japoneses genéricos (o saqué, o budismo e o quietismo, uma dialéctica das estações) ou imagens, situações e tonalidades reconhecíveis dos filmes (comboios, crianças, chaminés altas, um friso de amigos, filhas casadoiras, pais que envelhecem, a derrota na guerra, a transitoriedade, a solidão estóica e melancólica), algumas frases tanto podem ser citações dos guiões como frases “à Ozu”, sejam ou não dele (“temos de lhe encontrar alguém” “morrer virá a seu tempo”, “a vida desilude-nos muito”, “porquê mudar”?).