A chave na ignição é o gatilho que faz soar o motor tremulante sobre o alcatrão. Com um olho no final de uma estrada que se percorre há mais de duas décadas, e outro num retrovisor que reflete um passado que se reaproxima, Dominic Toretto (Vin Diesel) conduz paralelamente às faixas de quem com e contra ele aderem à corrida. A estrada ainda é sua mas — ao mesmo tempo que vai deixando espaço às gerações que o sucedem — vê o seu legado pisado por uma vingança que afunda no acelerador. As mãos que pousam firmemente no volante são de Dante (Jason Mamoa), que mete a primeira mudança em antecipação do fim. É este o princípio.
“Velocidade Furiosa X” (“Fast X”) é o décimo da saga e ocupa, a partir desta quinta-feira, os grandes ecrãs das salas de cinema, para dar continuidade ao que ficou pendurado no cruzar das cortinas do quinto filme: a morte do vilão Hernan Reyes, um traficante de droga brasileiro (interpretado pelo ator português Joaquim de Almeida) que deixa o filho Dante sem ninguém, mas com o fervoroso sabor do que planeia vingar. Como a morte seria misericordiosa, ao invés, persegue os rasgos que Dom desenhou num percurso a pneus, mapeando caminho para aqueles que mais ama. É esse medo que o conduz. A dinâmica de pai e filho constrói a narrativa.
Entre fogos de artifício que ecoam nos céus do Rio de Janeiro, Isabel saí de um carro pincelado num amarelo abrasileirado, cujas linhas escrevem uma história que coabita paralelamente - a duas janelas de distância - com a de Dom. “A sua grande entrada, o seu espaço e lugar para brilhar”, descreve-o ao Expresso quem lhe veste a pele: Daniela Melchior.
Desdobra-se o enredo com uma explosão em Itália, no Vaticano - o ponto de encontro entre os dois antagonistas, que se conhecem pela primeira vez. Mas Dante passou os últimos dez anos a estudar a vida de Dom até ao mais ínfimo detalhe obrigando-o a fazer escolhas. A primeira acontece no Brasil, que o recebe como se fosse parte da mobília, mas só se sente em casa depois de conhecer Isabel. Entre fogos de artifício que ecoam nos céus do Rio de Janeiro, saí de um carro pincelado num amarelo abrasileirado, conferindo-lhe nacionalidade, mas é nas linhas do modelo que conduz que se escreve uma história que coabita paralelamente - a duas janelas de distância - com a de Dom. “A sua grande entrada, o seu espaço e lugar para brilhar”, descreve-o ao Expresso quem lhe veste a pele: Daniela Melchior.
Tinha quatro anos quando o primeiro filme da saga se estreou, e a sua primeira memória de “Velocidade Furiosa” é a de uma também grande entrada. “Lembro-me de querer ser tão gira como a Suki”, ri-se. Vestida em tons cor-de-rosa, que lhe pigmentavam o carro do qual saía. “Tudo a combinar”, continua a atriz portuguesa, que dá agora vida a uma feminilidade que não se vê no amarelo do seu veículo, por estar discretamente escondida na dureza de uma street racer que carrega o passado nos olhos. E foi neles, desenhados num sorriso, que Dom soube: antes de se tornar família, Isabel já o era.
Para Daniela Melchior, para lá dos tunings dos carros, o “pilar” e a receita que une os fãs no tempo é esse mesmo: “A família é o que leva as pessoas ao cinema.” O mesmo lugar onde o seu nome surge nos créditos junto a um luxuoso elenco acarinhado pelo grande público. “Ainda tremo”, confessa, ao mesmo tempo que encara a expectativa com alguma curiosidade e identifica esse sentimento como um orgulho transformado em adrenalina.
“Acontece muito ser preciso ser reconhecido lá fora para de repente ter algum tipo de validação cá dentro”
Não sabe explicar o porquê, mas diz que “passa rápido” — a uma velocidade talvez semelhante àquela que guia a história abraçada no imediato pela atriz, que se vê estrelada no mundo. Um reconhecimento que em Portugal nunca imaginou, diz até achar “impossível” existir na mesma dimensão sem que se trabalhe “lá fora”. No “pequenino” Portugal, qual seria a chance? “Acontece muito ser preciso ser reconhecido lá fora para de repente ter algum tipo de validação cá dentro.” Quanto ao guião de onde retira as palavras da “sua” Isabel, confessa ao Expresso o quão fácil foi dizer-lhe que sim. “Desde a primeira vez que o leio, acredito no que estou a dizer.” Ressalva que no momento do corta, os sentimentos ficam ali — já aprendeu a desligar-se das personagens, despindo umas e vestindo outras. “Mas naquele momento, eu acredito”, conclui.
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