
Um filme onde o essencial reside nos intervalos entre as palavras, nos silêncios e gestos. O crítico Vasco Baptista Marques dá-lhe quatro estrelas
Um filme onde o essencial reside nos intervalos entre as palavras, nos silêncios e gestos. O crítico Vasco Baptista Marques dá-lhe quatro estrelas
A concisão é o mantra do novo Trueba, que começa com uma sequência de quatro longos grandes planos. Eles sondam os rostos absortos das quatro personagens que ao longo de 60 minutos a narrativa conhecerá: dois casais da classe média na casa dos 35 (Daniel e Elena, Guillermo e Susana) que, nesse quadro, se reúnem à noite num café madrileno, para assistir a um concerto.
Longe de constituir um exercício de estilo, essa sequência serve para definir o modus operandi de um filme onde o essencial reside nos intervalos entre as palavras, nos silêncios e gestos que, ora traem o seu sentido ora remetem para o fora de campo dos discursos (isto é, para o que as personagens de facto sentem e pensam).
É assim que, após o concerto, a inquietação que julgávamos ter entrevisto no rosto de Daniel será, de pronto, neutralizada pelas suas palavras. Elas visam adiar sine die a resposta ao convite que então chega do outro lado da mesa, onde, depois de anunciar que estão à espera do primeiro filho, Guillermo e Susana vão gabando a nova casa de campo nos arredores de Madrid, rematando o seu discurso com a exortação do título.
Neste ponto, termina a primeira parte de um filme que, após uma elipse de seis meses, se dedica a relatar a visita de Daniel e Elena a casa dos amigos.
Desconsiderando as significativas revelações feitas pelos anfitriões, o que aqui sobressai é a forma como Trueba consegue mergulhar-nos numa espécie de ‘eterno presente convulso’.
Com efeito, apesar da impressão de tempo suspenso que então cria (por via da encenação de uma tarde de fim de semana em que nada de especial acontece), a realização faz sentir que as personagens vão sendo a cada instante trabalhadas por dentro. Não só pelas memórias e anseios que o seu reencontro espoleta, mas também — como a penúltima sequência sugere — pela sensação de estranhamento a respeito do facto de estarem ali, juntas, passando umas com as outras através do tempo. Chapeau.
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