Cinema

O carnaval dos histéricos: o novo melodrama familiar do francês Arnaud Desplechin

31 dezembro 2022 17:10

Marion Cotillard and Melvil Poupaud nos papéis de Alice e Louis Vuillard

O novo melodrama familiar do francês Arnaud Desplechin explora, num registo sempre ponderoso, a relação de ódio visceral entre dois irmãos

31 dezembro 2022 17:10

A vida das personagens de Desplechin é algo que só se conhece ‘por decantação’, ou seja: através dos ponderosos filtros estilísticos que o cineasta interpõe entre elas e nós. Nos melhores casos, esses filtros servem para sublimar a banalidade por via do literário e do teatral. Nos piores, eles relevam do puro e simples automatismo, de um certo modo grandiloquente de filmar que — mesmo quando nada narrativamente o justifica — se impõe como um tique. “Irmão e Irmã”, o seu novo ensaio, inclui-se infelizmente na última categoria. Trata-se de um melodrama familiar centrado na dissecação de uma rivalidade patológica, onde as causas nunca bastam para explicar os efeitos hiperbólicos que delas parecem nascer; e que, por isso mesmo, acaba por se assemelhar a uma tosca colagem de gestos e palavras histéricas.

O mote fica dado logo no prefácio que precede o genérico. Nele, acompanhamos a discussão de faca e alguidar que põe frente a frente os dois irmãos do título: Louis (Poupaud), um poeta e professor que, em sua casa, vai velando o cadáver do seu filho de seis anos, e Alice (Cotillard), uma consagrada atriz de teatro que, nessa noite, lhe bate à porta para lhe dar as condolências — sendo prontamente escorraçada do local pelo irmão, à base de gritos, lágrimas e insultos. O que se segue é uma tentativa de auscultar as raízes do ódio intestino que — a julgar pela amostra — grassa entre Louis e Alice.