Cinema

“O Joelho de Ahed”, a história de um homem revoltado dá um dos filmes do ano

12 agosto 2022 18:34

“O Joelho de Ahed” é o filme mais contundente de Nadav Lapid até à data

“O Joelho de Ahed”, premiado em Cannes, revela com raiva bruta um estado de angústia que atravessa a sociedade israelita. Nas salas a partir de quinta-feira

12 agosto 2022 18:34

Nadav Lapid (Telavive, 1975) impôs-se rapidamente no panorama internacional como o mais corajoso e politicamente comprometido cineasta israelita da sua geração, Portugal acompanha o seu percurso desde “O Polícia” (2011), o Curtas fez em 2018 uma retrospetiva da sua obra, e é ele, recorde-se, o autor de “Sinónimos”, Urso de Ouro em Berlim 2019. Um ano antes desta obra controversa, sucedeu ao cineasta um episódio caricato que o levou, num ímpeto, a escrever “O Joelho de Ahed” (distinguido em Cannes 2021 com o Prémio do Júri). Uma mulher de voz gentil, funcionária das bibliotecas estatais do país, telefonou-lhe a convidá-lo a apresentar um filme dele na biblioteca de Sapir, pequena vila da região de Arava, no extremo sul israelita. Nadav nunca tinha visitado esta zona desértica e quase inabitada, sem cinemas nem teatros, e onde as bibliotecas são o único polo de atividade cultural. O problema surgiu quando a funcionária mencionou um documento que ele deveria preencher e assinar obrigatoriamente para validar o convite. Era uma lista de temas autorizados pelo Governo que o cineasta deveria selecionar para debater com a audiência, garantindo sob compromisso de honra não abordar nenhum outro. Nadav sentiu-se agredido: a liberdade de expressão estava afinal em xeque por subtil forma de censura que vinha nem mais nem menos que do Ministério da Cultura de um país dito democrático! E mais furioso ficou quando a funcionária desabafou que não estava propriamente orgulhosa do que estava a fazer, mas que há dois anos se via obrigada a seguir o protocolo. De facto, e escassos meses após este episódio, Israel aprovaria uma Lei que, em nome da “lealdade da cultura”, permitia interditar sumariamente o financiamento de qualquer obra de arte “considerada infiel ao Estado.”

Até certo momento, o protagonista deste filme — um cineasta de meia idade que responde por um kafkiano Y — é um alter-ego de Lapid e a história de “O Joelho de Ahed” um decalque do que se contou acima. A ficção vai dramatizar em seguida o que está em causa, agudizando a tensão entre o recém-chegado cineasta citadino e a atraente bibliotecária que o espera na vila de província (é inegável que, naquela espécie de no man’s land, o filme começa por indiciar um encontro erótico entre as personagens de Avshalom Pollak e Nur Fibak), lançando depois este duo para um confronto de grande violência emocional em que Y acabará por destilar uma raiva bruta contra os nacionalistas (e os nacionalismos) do seu país.