A Revista do Expresso

Fica em Londres, mas o Museu Freud é uma casa portuguesa

21 maio 2023 10:03

HISTÓRIA Divã no consultório de Sigmund Freud, em Londres

freud museum, londres

Aberta há quase 40 anos como museu, a casa onde Sigmund e Anna Freud trabalharam e morreram em Londres é zelada por uma família portuguesa

21 maio 2023 10:03

Sigmund Freud gostava de ler sentado diagonalmente numa cadeira reclinável, empunhando o livro em frente ao rosto e de perna traçada sobre o amparo braçal da cadeira. Punha a perna onde devia estar o braço (o que talvez possa ser objeto de uma interpretação freudiana...). Em 1930, a filha mais velha, Mathilde, pediu ao arquiteto Felix Augenfeld que lhe fizesse uma cadeira que se ajustasse confortavelmente aos hábitos do pai, para lha oferecer. O resultado foi a cadeira ‘surrea­lista’ — um objeto antropomórfico com (amparo de) cabeça, tronco e membros, qual amiga de braços abertos pronta a acolher o insigne leitor. Está hoje junto à secretária no Grande Salão — o estúdio-escritório-consultório que é o cérebro da Casa-Museu Freud, em Londres —, onde funciona como contrapartida ao famoso divã coberto com uma tapeçaria persa Qashqa’i. (O cunhado de Freud era importador de tapetes orientais.) Pois foi sentado numa réplica daquela cadeira — construída há cerca de 20 anos pela produtora de um documentário filmado na casa — que passei horas a conversar e a ouvir as muitas histórias que Daniel Bento, o factual ‘gestor operacional’ do Freud Museum, tem para contar. Embora estivéssemos ambos alerta e bem sentados, sei que nos nossos subconscientes cruzávamos lembranças das nossas vidas com as ideias de Freud. (Outra réplica da cadeira está a ser feita para o filme de Matt Brown, “Freud’s Last Session” — com o escritor C. S. Lewis —, baseado na peça de Mark St. Germain, a ser rodado na Irlanda com Anthony Hopkins no protagonista.)

Não me lembro exatamente de quando Freud entrou na minha vida. Deve ter sido na adolescência, nas aulas de Luís Terry, o meu professor de Filosofia no Liceu Pedro Nunes. O que sei é que, quando entrou, ficou e ajudou-me a crescer mentalmente e a compreender os outros e a mim próprio. Sigmund Freud (1856-1939) morreu quando eu tinha um ano e meio. Deu-me mundo e tornou-me mais generoso. Hoje, Freud integra o meu quinteto de guias geniais, com Shakespeare, Faraday, Darwin e Bertrand Russell. Em Viena visitei a sua casa no sombrio nº 19 de Berggasse; em Londres — para onde Freud fugiu, em 1938, com a mulher Martha e a filha Anna (1895-1982), escapando ao nazismo — conheço bem a sua bela e arejada casa e jardins no nº 20 de Maresfield Gardens, no bairro de Hampstead.

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