25 dezembro 2022 10:18

Carmelitas, franceses, irmãos, Eça de Queirós, invasores e militares, aviões, cartas, jornais e turistas. Tudo cabe na história de uma livraria do tamanho do mundo
25 dezembro 2022 10:18
Cidade do Porto, Rua das Carmelitas. Shakespeare colocou na boca de Julieta a filosófica e hoje famosíssima interrogação “What’s in a name?”, concluindo depois, para conveniência dos amores entre o apaixonado Montéquio e a adolescente Capuleto, que nada lá se encontra, tratando-se apenas de uma etiqueta arbitrária, palavra oca e trivial, mero significante sem significado. Não é, porém, o que acontece com esta rua portuense, pois durante mais de 100 anos lá viveram, de facto, carmelitas, do ramo descalço, fiéis seguidoras de Santa Teresa de Ávila, ela própria representada de pé ao léu na escandalosa representação que Bernini, em imortal mármore branco, esculpiu para a romana Capela Cornaro.
Vivendo em clausura e rigorosa contemplação, mergulhadas numa austeridade que em nada se relacionava com o berço de onde provinham, visto serem muitas delas, provavelmente a maioria, mulheres de nobre condição social, entenderam fugir do seu convento durante o Cerco do Porto, temendo a confusão instalada na cidade. Apesar das tentativas, nunca conseguiram regressar ao cenóbio, encurraladas entre a extinção das ordens religiosas e a voracidade dos vários poderes públicos, que logo iniciaram uma aguerrida disputa pelos edifícios e terrenos. A Câmara Municipal do Porto, no ano de 1873, consegue finalmente a posse da antiga casa das pobres descalças, não sem antes esta ter servido como estação de correios e telégrafos, cavalariça da mala-posta, escola, esquadra da polícia, armazém de cereais, teatro de variedades, cantina para operários, etc., numa infinidade de utilizações alternativas a que só a demolição em larga escala e o processo de loteamento do novo bairro das Carmelitas, já no início do século XX, vêm pôr termo. Esquartejado em parcelas colocadas à venda em diversas sessões de hasta pública, acaba por atrair a atenção de dois irmãos, José e Manuel Lello, que em 1904 compram uma gleba para cada um, o primeiro para instalar uma livraria e o segundo uma gráfica.
Este é um artigo do semanário Expresso. Clique AQUI para continuar a ler.