28 agosto 2022 22:34

O caso da identidade europeia é peculiar. A Europa é um conceito movediço, uma configuração geográfica, política e demográfica cujas partes integrantes se alteram constantemente
28 agosto 2022 22:34
No fim do século I a.C., Caio Júlio Higino, liberto espanhol e bibliotecário de Augusto, coligiu e deu forma a vários mitos tradicionais gregos e romanos, incluindo uma história sobre a origem da Europa. Segundo Higino, Júpiter (ou Zeus) enamorou-se de Europa, filha do rei fenício Agenor, e, transformando-se num touro, arrancou-a do seu reino e levou-a para Creta. Agenor enviou os irmãos de Europa no encalço dela, advertindo-os de que não voltassem a casa sem a encontrarem. Não houve regresso. Destes irmãos, o mais famoso é Cadmo, pois dizia-se que tinha levado consigo, na busca, muitas das extraordinárias invenções fenícias, como o alfabeto, tendo sido ele o responsável por conceder ao mundo grego o privilégio da escrita. Cadmo, irmão de Europa, tornou-se assim no emissário de um modo de vida mais sofisticado, que teve origem no Mediterrâneo Oriental: para uns, Ásia; para outros, África.
Europa pode ter aterrado em Creta, mas os gregos continuavam a achar que o seu reino era o Norte Bárbaro, uma terra incivilizada, lá longe; um continente distinto da sofisticada Fenícia de Agenor e das cortes opulentas do Extremo Oriente. Heródoto, usando do entendimento de historiador, negava que a denominação do continente se devesse a esta Europa, “uma princesa asiática que nunca visitou a terra a que chamamos agora Europa, tendo apenas navegado da Fenícia para Creta e de Creta para Lícia”. Mas a alegação de Heródoto foi ignorada. Em que consiste este continente a que chamamos Europa? Inclui a Grã-Bretanha depois do ‘Brexit’? Deve incluir a Ucrânia? Deve incluir a Turquia? A Rússia (segundo Putin) faz parte da Europa. O que significa isto hoje em dia? O que queremos dizer quando dizemos ‘Europa’?