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Como lidamos em Portugal com o passado autoritário?

Como lidamos em Portugal com o passado autoritário?

Esta quinta-feita é apresentado o livro “O Essencial da Política Portuguesa”, a versão traduzida do Oxford Handbook of Portuguese Politics, coordenado por Jorge Fernandes (CSIC, Madrid), Pedro Magalhães (ICS-ULisboa) e António Costa Pinto (ICS-ULisboa). A edição portuguesa é parceria editorial entre a FFMS e a Tinta-da-China. O Expresso pré-publica um dos 48 capítulos deste livro com contou com a colaboração de 68 investigadores

Filipa Raimundo

Introdução

Durante a campanha presidencial portuguesa de 2021, um jornal de grande circulação nacional fez um conjunto de perguntas a todos os candidatos. Aos sete candidatos presidenciais, perguntava­-se: «Se for eleito, vai comemorar o 25 de Abril no Parlamento? Como?» A questão referia­-se ao dia em que, em 1974, um grupo de militares de média patente pôs fim a 48 anos de autoritarismo em Portugal. Ao responder à pergunta do jornal, todos os candidatos presidenciais, da extrema­-esquerda à extrema­-direita, manifestaram intenção de preservar as comemorações anuais. Desde 1977, essas comemorações incluem uma cerimónia oficial realizada no Parlamento durante a qual o presidente e os representantes dos partidos proferem discursos perante o plenário. O candidato de direita radical afirmou: «Pretendo comemorá­-lo como tem sido feito. É uma data que deve ser assinalada, que marca o início da transição de Portugal para um regime democrático.» E acrescentou: «Mas o 25 de Novembro também deve ser celebrado […], porque impediu que fôssemos uma ditadura de extrema­-esquerda ao estilo soviético.»[1]

Esta última data refere­-se ao momento em que, em 1975, uma acção ilegal levada a cabo por alguns pára­-quedistas foi entendida como uma tentativa de golpe da extrema­-esquerda, permitindo que os militares pró­-Governo e os aliados anticomunistas aproveitassem a oportunidade e recuperassem o controlo. A derrota da extrema­-esquerda em 1975 contribuiu para diminuir a incerteza quanto ao desfecho do processo de democratização, colocando o país no caminho da consolidação democrática (Rezola, 2006; Lobo et al, 2016; Pinto, 2006; Raimundo, 2015). Enquanto o dia 25 de Abril é uma data bastante consensual em Portugal, o dia 25 de Novembro não o é. Este último é interpretado pelos partidos políticos mais à esquerda como um golpe destinado a interromper a revolução, enquanto os partidos mais à direita o consideram um marco importante no caminho do país para a democracia liberal. O principal partido de centro­-esquerda (PS) coloca­-se entre estas duas posições; apesar de ter participado na aliança anticomunista em 1975, evita qualquer ligação com a direita. Com este pano de fundo, o presente capítulo propõe­-se analisar a forma como Portugal lidou com o seu passado autoritário ao longo das últimas quatro décadas.

Na próxima secção, será apresentada uma breve visão geral do regime autoritário português, do modo como este findou e do tipo de mecanismos de justiça transicional adoptados para lidar com o passado, de uma perspectiva comparada. Em seguida, será analisada a forma como os principais partidos políticos geriram as heranças do passado autoritário, incidindo na sua própria bagagem histórica e nos papéis que desempenharam durante a transição para a democracia. A última secção analisa as principais clivagens que estruturam o voto em Portugal, averiguando a razão por que o regime autoritário não criou uma nova divisão entre os cidadãos portugueses. O capítulo termina com uma visão geral das principais ideias e algumas sugestões para investigação futura.

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