O aviso não é novo, mas a conjuntura externa e interna levou Marcelo Rebelo de Sousa a atualizá-lo. O Presidente aproveitou a sessão solene no Parlamento sobre os 200 anos da primeira Constituição portuguesa para avisar que “haver uma Constituição escrita por si só nada garante” e que embora celebrar o constitucionalismo seja “celebrar a liberdade”, “é uma ilusão pensar-se que não podem surgir novos tropismos anti-liberais ou anti-democráticos”.
“É olhar para o que se passa no concerto das nações", afirmou Marcelo, e perceber como “as crises externas e internas, as fragilidades, incompetências, injustiças, pobreza, desigualdades, alimentam saudosismos e apelos de caminhos em que a democracia e a liberdade podem vir a valer menos do que, temores, securitarismo ou autoritarismos”. O crescimento eleitoral do Chega esteve nas entrelinhas do discurso presidencial.
A resposta para evitar saudosismos “é simples”, defendeu o Presidente. “Ou os poderes públicos e protagonistas políticos, económicos e sociais dão constante exemplo de vida, humildade, proximidade, responsabilidade e solidariedade, ou democracia e liberdade em vez de avançarem, recuam”.
A história do constitucionalismos português que o diga e Marcelo Rebelo de Sousa passou em revista as vicissitudes do “longuíssimo e atormentadíssimo percurso” até chegarmos à Constituição de 1976 - “para a esmagadora maioria dos portugueses só aí surgiu a democracia”. Antes, “as promessas da Constituição de 1822 tiveram que esperar décadas”, houve “a Constituição anti-democrática de 33”, houve a “ditadura a interromper a 1ª República”, e isso confirma que o texto constitucional só por si não chega. Pode até “simular o que não é”.
“O essencial, afirmou o Presidente da República, é perceber que ”é impossível construir a liberdade sem quem a defenda" e quem a queira defender deve perceber que “cada dia tem que ser um dia de avanço”. Com a consciência de que “é extremamente difícil construir liberdade com a oposição militante de amplíssimos setores sociais ou de estritos mas dotados de efetivo poder político” setores que alimentem os “saudosismos”.
“Será que estes herdeiros (dos saudosistas do passado anti democrático) desapareceram?”, questionou o Presidente, convicto de que “é uma ilusão pensar-se que não podem surgir novos tropismos”. Basta que a “realidade do dia a dia das pessoas" não seja feita “de passos de progresso e justiça, mesmo se com altos e baixos, sobretudo em tempos de pandemias, guerras ou crises económicas”.
“Ou há passos de efetiva justiça e igualdade ou a democracia recua”, insistiu Marcelo Rebelo de Sousa, apelando a “todos nós, a começar pelos eleitos” para que “façam de cada dia um dia de avançao para que o povo não caia na tentação” de “messianismos e sebastianismos”.
A bancada do Chega não aplaudiu o Presidente.
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