Política

Uma “questiúncula” chamada Pedro Nuno Santos. Ou como criar um facto político sem abrir a boca

Pedro Nuno Santos, Duarte Cordeiro e Marta Temido
Pedro Nuno Santos, Duarte Cordeiro e Marta Temido
Ana Baiao

Pedro Nuno Santos esteve na mesa do congresso, mas não falou aos camaradas, nem aos jornalistas. E disputou com Marta Temido o campeonato das selfies e dos abraços

Ao fundo da sala, a conversa estava animada. Pedro Nuno Santos, Ascenso Simões, Marcos Perestrello, João Galamba e Francisco César falavam há largos minutos à entrada do congresso, encostados às baias, quando a conversa é interrompida a dada altura por um casal que pede ao ministro das Infraestruturas uma selfie. Sorriso para aqui, sorriso para ali. A popularidade no congresso do PS deixou de ter como medidor o ‘palmómetro’, para passar a ser a calculadora de selfies. E nesse campeonato, Pedro Nuno Santos só teve a ministra da Saúde, Marta Temido, como sombra. E isso é um facto político.

Tal como o é toda a postura do socialista no primeiro dia de congresso do PS. Falar, falou. Mas no palco do congresso não se ouviu. Cumpriu o silêncio público prometido, mas a promessa acabou por se tornar ruidosa, marcando as conversas da manhã. O principal candidato à sucessão de António Costa - quando acontecer, seja em 2023 ou depois - acabou por ser o facto político em Portimão: atrasou-se, foi o último a chegar e quando há um vazio no meio de uma mesa recheada de possíveis, putativos ou eventuais candidatos, nota-se.

Chegou já o seu nome tinha sido pronunciado por Luís Graça, o presidente da Federação do Algarve que chamou um a um os nomes da mesa do congresso. Aliás, quando Pedro Nuno Santos chegou, eram 12h12, já nem na lista da mesa pôde votar.

Esperou, com o amigo Duarte Cordeiro, fora de portas para não atrapalhar o discurso do presidente do partido, Carlos César. Cercado por jornalistas, a resposta foi quase uma meta-conversa sobre o seu silêncio: “Falo muitas vezes, há quem diga que até falo demais”, respondeu. Para bom entendedor uma frase basta.

Há três anos, na Batalha, para muitos, Pedro Nuno Santos falou em demasia. Levantou o congresso ao defender os acordos à esquerda e o papel do Estado e ouviu de António Costa o recado mais ruidoso que marcou a relação entre os dois: “Não meti os papéis para a reforma”

Agora, foi o contrário. Pedro Nuno Santos fez saber com antecedência que não iria falar, não seria por isso que seria falado, não seria por falar que criaria um acontecimento político, que roubasse o palco. Depois do 80, a escolha pelo 8 abre portas a todas as leituras ou “questiúnculas”. “Vocês perdem tanto tempo com questiúnculas e coisas que não interessam nada a ninguém", respondeu António Costa aos jornalistas, que lhe perguntaram sobre a ausência de Pedro Nuno (ainda não tinha chegado). Mais tarde, haveria de brincar com a situação numa entrevista à SIC: “Não sei se teve um furo, se adormeceu”.

Nessa mesma entrevista, António Costa haveria de fazer um elogio pouco habitual ao seu ministro. "Estou muito contente com a atividade que ele tem feito como membro do Governo", disse. E acrescentou que reconhece o esforço do ministro para defender o que para muitos é "impossível que é defender uma empresa estratégica para o futuro do país que é a TAP”.

Costa pôs quatro rosas numa jarra

Carlos César não gostou de ver a amena cavaqueira no fundo da sala. Do palco pediu aos camaradas que desmobilizassem. Pedro Nuno Santos acatou a ordem e foi sentar-se no seu lugar: a mesa do congresso que lhe foi destinado por Carlos César e por António Costa.

O secretário-geral do PS fartou-se de negar que a sua sucessão seja o tema, mas foi também o próprio que decidiu dar o palco aos quatro nomes que se falam: além de Pedro Nuno Santos, Mariana Vieira da Silva, Ana Catarina Mendes e Fernando Medina.

Há um contraste nas posturas entre os quatro: Mariana e Ana Catarina Mendes estiveram quase sempre sentadas no lugar de destino. Fernando Medina e Pedro Nuno Santos foram mais irrequietos. Os três falaram, Pedro Nuno ficou calado, mas assim que percebeu que Fernando Medina estava a falar entrou na sala para o ouvir.

De um modo ou de outro, a falar ou em silêncio, com atrasos ou a chegar a horas se criam factos políticos e Pedro Nuno Santos já tem essa escola.

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