Exonerado. Ao fim de quase um mês desde que o Expresso e o Observador noticiaram que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) divulgava dados pessoais de manifestantes a embaixadas estrangeiras, o responsável pela proteção de dados da autarquia foi afastado. Essa era, aliás, a ideia de Fernando Medina desde a primeira hora.
Na reunião extraordinária desta sexta-feira, que transitou do dia anterior, foram votadas as três propostas que estavam por resolver: a exoneração do encarregado de proteção de dados (EPD), a nomeação do seu sucessor e ainda a alteração de competências da equipa de projeto por ele coordenada, que foi escolhida em 2018 para fazer a gestão do tratamento de dados na CML.
Com recurso a voto secreto, as três propostas foram aprovadas com oito votos a favor — exatamente o número de vereadores do PS ou de independentes eleitos pelas listas do PS. No caso do afastamento do EPD, houve seis votos contra e três abstenções, que permitiram cumprir a vontade de Medina. As outras duas propostas tiveram menos um voto contra e mais uma abstenção.
Questionado pelo Expresso, o vereador do PCP Jorge Alves assume a abstenção do partido, que tem mais um lugar na vereação. Houve, por isso, uma abstenção à direita. “Alguém não assume o seu voto, nós fazemo-lo”, diz Alves.
O PCP considera que há muitas responsabilidades por apurar — “por isso votámos ontem a favor da auditoria externa” [proposta pelo CDS] — e que “o caso é grave”, o que impede o partido de votar a favor do afastamento desta equipa e do EPD em particular. “Mas também não votamos contra porque isso significaria dizer que temos um problema e não mudamos nada.”
O PCP absteve-se assim nas três propostas, abrindo caminho para a substituição da equipa de proteção de dados. Assim, a ideia, aponta Jorge Alves, é “em função deste problema, alterar a estrutura da Câmara, criando condições para que este serviço, que estava centrado numa figura [o EPD], passe para um conjunto de equipas”.
A restante oposição, à direita, já se tinha revelado contra a exoneração do EPD.
Era essa também a posição do Bloco de Esquerda, que faz parte da maioria que governa a CML. Em comunicado, o partido declarou que todos os funcionários “sabem o esforço enorme que a equipa de missão levou a cabo nos últimos anos para eliminar velhos costumes” de forma a cumprir o Regime Geral de Proteção de Dados, que entrou em vigor em 2018.
“Fica a sensação de que o Partido Socialista quer exonerar a única pessoa que fez algo para que este caso não viesse a acontecer”, escreveu ainda o BE. Ao Expresso, o vereador Manuel Grilo confirma o voto contra, lembrando que, mesmo que o EPD tivesse uma “ação criticável”, por demora na resposta ao problema, não pode ser exclusivamente responsabilizado.
Fernando Medina tem outra ideia. Disse-o no Parlamento, frisando que a equipa que o EPD coordenava não cumpriu a tarefa para a qual foi nomeada. O mandato até tinha sido prorrogado cerca de um mês antes de estalar a polémica, mas na audição parlamentar, Medina imputou responsabilidades à equipa. “Houve uma falta com uma dimensão importante, quando uma unidade inteira de apoio ao serviço da presidência não tem os serviços avaliados em matéria de proteção de dados. Há uma falha nestes processos desde 2018”, disse. “É por essa razão que entendo que, para restabelecer a confiança nos serviços, devo propor essa exoneração.”
O EPD agora afastado é um funcionário de carreira da Câmara, com mais de 30 anos na estrutura. Deixa assim o cargo de coordenação, o que, segundo fontes ouvidas pelo Expresso, significa também uma regressão salarial, já que não deverá passar a qualquer outro cargo de chefia. Mantém-se, no entanto, como funcionário da CML.
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