Política

Ex-presidente do TC acusa PGR de ser “agente encoberto”, dispara contra Costa e Cabrita (e avisa contra “bunker” para “acolher corruptos”)

Ex-presidente do TC acusa PGR de ser “agente encoberto”, dispara contra Costa e Cabrita (e avisa contra “bunker” para “acolher corruptos”)
TIAGO MIRANDA

Manuel Costa Andrade, ex-presidente do Tribunal Constitucional, foi às jornadas parlamentares do PSD criticar propostas dos vários partidos para punir enriquecimento injustificado defendendo que podem ter efeito "preverso" e funcionar como "bunker" para políticos corruptos. Recados foram muitos: ao Governo que não reconduziu ex-PGR e à atual PGR de ser "agente encoberto à revelia da Constituição"

Para o ex-presidente do Tribunal Constitucional não há forma constitucional de criminalizar o enriquecimento ilícito. Há forma, sim, de criminalizar a falta de transparência, mas isso pode ter um efeito "perverso" junto dos políticos que forem de facto corruptos. Foi o que Manuel da Costa Andrade foi dizer aos deputados do PSD num painel sobre reforma da justiça nas jornadas parlamentares que decorrem em Portalegre, numa intervenção longa onde deixou duros (e velados) recados à atual Procuradora-Geral da República, que acusou de agir contra a Constituição.

Numa altura em que o Parlamento se prepara para discutir, no próximo dia 25, propostas dos vários partidos para punir a ocultação de riqueza dos titulares de cargos públicos e políticos, tendo o PSD avançado com uma proposta no sentido de aumentar as penas a quem omitir a declaração, Costa Andrade sugere, por um lado, que fazer isso "pouco adiantará em matéria de luta contra a corrupção", e, por outro, pode ter um "efeito perverso".

"Alguém pode ser condenado por atentado contra a transparência, só que esta condenação pode valer como carta de alforria do corrupto, imunizando-o contra a possibilidade de ser punido por corrupção", disse, defendendo mesmo que uma nova lei nesse sentido "pode desencadear o efeito preverso de frustrar o objetivo almejado (que é a punição da corrupção)".

E explica por outras palavras: "Sob a bandeira da luta contra a corrupção, estas propostas, se forem convertidas em lei, valerão como bunker a que os corruptos podem acolher-se tranquilamente", disse. Ou seja, mesmo que se provar que os rendimentos declarados até eram de origem ilícita, "criminosa até", esse dado não pode depois ser usado contra o declarante para sustentar a sua condenação por corrupção. Isto porque "ninguém pode ser condenado por factos ou provas que foi obrigado a levar ao conhecimento do tribunal", explicou Costa Andrade.

Recados ao MAI, ao Governo, à PGR (e ao Chega, à atenção do PSD)

Numa intervenção muito dura no auditório do Centro de Artes e Espetáculo de Portalegre, o ex-presidente do TC criticou duramente, embora sem dizer o nome, o ministro da Administração Interna por causa dos festejos da Liga dos Campeões. "Ministros que se movem ao nível da inexistência, mesmo quando mercadejam a autoridade do Estado, sacrificam a dignidade dos portugueses, humilhados e feitos estrangeiros no seu país, denegando-lhe privilégios que com vassalagem prodigalizam a estrangeiros ruidosos e violentos, só porque consomem álcool e trazem uma saca carregada de libras”, afirmou, numa alusão clara à recente realização da final da Liga dos Campeões de futebol no Porto.

Ao Governo de António Costa, Costa Andrade imputou ainda o pecado de não ter reconduzido a anterior Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, e o anterior presidente do Tribual de Contas -- "pessoas reconhecidamente competentes e idóneas". Em vez disso, o Governo pôs no seu lugar uma nova PGR, Lucília Gago, que, no entender de Costa Andrade, age "à revelia da Constituição e da lei". "Assiste-se agora com complacência ao propósito declarado e formalizado pela PGR de pretender intervir ativamente no processo criminal escondendo depois a mão e apagando as pegadas dos seus passos, agindo como um agente encoberto à revelia da Constituição e da Lei, como é próprio de um poder inquisitório", acusou. Isto a propósito de uma diretiva que Lucília Gago impôs aos magistrados, obrigando-os a reportar aos superio­res as diligências que fizerem e, em caso de desacordo, terem de obedecer às ordens - em casos que tenham repercussão pública e que envolvam “pessoas especialmente expostas”.

A acusação chegou depois de Costa Andrade ter defendido ativamente a velha proposta de Rio de ter uma maioria de não-magistrados nos órgãos como o Conselho Superior do Ministério Público.

Mas a Rui Rio, que não estava na sala, também deixou um recado subtil sobre eventuais (e futuras) aproximações a um partido como o Chega. Sem dizer o nome do partido, Costa Andrade fechou totalmente a porta a qualquer conversa com quem quer restaurar a pena de morte em Portugal, dizendo que se o PSD o fizesse estaria a "vender a alma ao Diabo". "Quando se chega aqui atinge-se o inultrapassável que não pode sequer ser motivo de conversa. Só a coberto da irresponsabilidade e da inimputabilidade político-cultural se pode sonhar em restaurar a pena de morte no país pioneiro na sua abolição (…) Uma proposta que o PSD só podia negociar se estivesse disposto a vender a alma ao Diabo”, disse, sem nunca se referir ao partido liderado por André Ventura.

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