Política

Passos defende legado e ataca “inação”, “passa-culpas” e “populismos” do Governo

Passos defende legado e ataca “inação”, “passa-culpas” e “populismos” do Governo
TIAGO PETINGA/LUSA

Ex-primeiro-ministro aproveitou conferência de homenagem a Alfredo da Silva para arrasar os governantes que cedem "ao autoelogio" e não assumem responsabilidades. Foi do SEF à TAP, das avaliações na educação à crise de refugiados em Moçambique

Se não foi uma defesa da honra do seu Governo, pareceu. Pedro Passos Coelho aproveitou esta sexta-feira uma conferência na Academia das Ciências, em Lisboa, para arrasar o executivo de António Costa na gestão de casos que têm dominado a atualidade política. O ex-primeiro-ministro não concebe que em dossiês como o da TAP ou o da avaliação TIMMS (que avalia as competências dos alunos do primeiro ciclo nas ciências e na matemática) prevaleça a lógica de "passa-culpas" para a equipa que chefiou nem aceita que a morte de Ihor Homeniuk continue sem que se assumam responsabilidades ao mais alto nível.

Numa intervenção que levava escrita em 14 páginas, Passos disse - sem nomear quem quer que fosse - que "chega a ser chocante ver responsáveis políticos e governantes a cederem ao autoelogio e ao desafio arrogante, quando não ao puro passa-culpas, em vez de assumirem responsabilidades, tanto por fracassos, como por verdadeiros escândalos que afetam a reputação externa do país e abalam a confiança dos cidadãos nas suas instituições".

E, na palestra “Globalização em português, revoluções e continuidades”, logo concretizou, falando em "três exemplos" bem recentes e, "infelizmente, muito eloquentes, que não teriam ocorrido nos termos em que ocorreram se os valores éticos e o exemplo cimeiro de responsabilidade" tivessem sido outros.

Referia-se, desde logo, aos resultados do programa TIMMS. Um dos "casos lastimáveis", sublinhou o antigo líder do PSD, "de fuga às responsabilidades" e "da ausência de humildade para corrigir políticas" que se "revelaram desadequadas".

Responsabilizar Nuno Crato e a equipa do então Ministério da Educação (como fez o Governo), acrescentou, "além do ridículo, apenas serve para sublinhar como o populismo e o facilitismo podem animar o debate político, mas sempre acabam por desqualificar as políticas públicas e por impor um ónus sobre as futuras gerações".

A morte de Ihor e os prejuízos da TAP

Daí saltou para a morte do cidadão ucraniano no aeroporto de Lisboa, em março, episódio em que, na ótica de Passos, tem havido a "procura de um bode expiatório". Após meses de "incompreensível inação", e "com a autoridade do Estado seriamente abalada e a confiança nas instituições públicas beliscada", o antecessor de Costa considera que "tudo tem servido para procurar disfarçar o indisfarçável", ou seja, "as falhas graves" dos organismos públicos.

Passos não vislumbra motivos para a "incompreensível relutância em defender o Estado da fuga às responsabilidades dos seus dirigentes" - o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, leia-se -, os quais "preferem lançar o opróbrio injusto" sobre todo o SEF, apontando até para o seu "esvaziamento funcional", em vez de assumirem as responsabilidades políticas pelo sucedido.

Quanto à TAP, que tinha privatizado em 2016 (durante os breves dias do seu segundo Governo), Passos também demonstrou ter poucas dúvidas. E fala mesmo num imbróglio "emblemático da insustentável leveza da irresponsabilidade pública na condução do interesse coletivo", em linha com o que Cavaco Silva afirmara também esta semana, numa entrevista concedida ao "Observador".

"Agora que a TAP está ameaçada na sua sustentabilidade, em vez de serem os privados, que arriscaram investir na privatização, a responderem pelos resultados perante a banca e as empresas de leasing, entre outros credores, são o Estado e os contribuintes quem têm de assumir os prejuízos que já quase só podem dividir com os funcionários da empresa, que mais parece ter sido renacionalizada", observou, lamentando ainda as "querelas políticas" que têm dominado o debate sobre a companhia aérea.

"Esta fatura que o governo se prepara para endossar vai ser suportada por muitos anos, por muitos governos e demasiados contribuintes, a quem o Estado não vê hoje com respeito nem parcimónia", criticou o antigo primeiro-ministro.

Moçambique. "Passividade não tem explicação"

Na radiografia arrasadora que fez ao país, Passos ainda apontou para a frente internacional. Primeiro carregou sobre as lacunas da estratégia para a internacionalização e captação de investimento - que não se alcançam com uma "agenda externa de discursos de fachada". Depois notou não haver justificação para se negligenciar tanto a lusofonia.

Exemplo? O problema humanitário dos refugiados desencadeado por sucessivas ondas de ataques terroristas em Moçambique, os quais reclamariam, na sua perspetiva, "uma outra atitude de responsabilidade e de solidariedade", ao invés da, "pelo menos, aparente, passividade portuguesa", que "não tem explicação”.

A terminar a conferência - que se inseria num programa mais amplo de homenagem a Alfredo da Silva, um dos maiores empresários e industriais portugueses de sempre, Passos deixou uma mensagem para futuro, que os seus indefetíveis estão a ler como um sinal de que vai andar por aí. Dirigindo-se aos mais velhos, disse ser da sua "estrita responsabilidade" não deixar "as novas gerações sozinhas" na tarefa de empreender uma mudança no país. Esse "esforço", realçou, "será tanto maior quanto o peso do legado de omissões" que "eticamente" a sua geração tem "o dever de evitar".

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