3 dezembro 2019 23:23
estela silva/lusa
No debate 'Conversas à Porto', no Rivoli, os presidentes das duas maiores autarquias do país defenderam que o grande travão à regionalização é Marcelo Rebelo de Sousa, hoje enquanto Presidente da República, como o foi há duas décadas como líder do PSD. Moreira e Medina lembram que as quatro maiores forças políticas na Assembleia da República são a favor das regiões
3 dezembro 2019 23:23
No frente a frente promovido, esta terça-feira, no Porto, pela associação Cívica 'Porto, o Nosso Movimento', Rui Moreira e Fernando Medina sustentaram que não há como retroceder na regionalização, não só por ser fundamental para o desenvolvimento e coesão territorial, mas por ser esse o sentimento das quatro maiores forças políticas com assento parlamentar: PS, PSD, Bloco de Esquerda e CDU. Com apenas o CDS-PP contra - “Assunção Cristas” advertiu alguém do público -, os dois autarcas lembraram que a regionalização administrativa consta da Constituição, razão pela qual defendem que basta uma alteração à lei, por uma maioria de dois terços, para que as regiões avancem “sem necessidade de referendo”.
“Acho estranho que uma coisa que está na Constituição tenha de ser referendada”, afirmou o presidente da Câmara do Porto, frisando que o país teve eleições há pouco tempo e que as forças políticas foram, por isso, legitimadas pelos cidadãos para alterarem a lei fundamental no parlamento. “E julgo que a Iniciativa Liberal também deve querer regionalizar”, alertou Rui Moreira, referindo-se ao posicionamento dos pequenos partidos.
Fernando Medina vai ainda mais longe, ao alertar que o referendo não foi inscrito na Constituição por clamor nacional “mas como estratégia para que não fosse aprovado”.
Duas décadas depois do chumbo à regionalização, o presidente da Câmara de Lisboa advertiu que “há um Portugal novo, que quer mudar”, mudança que, alega, passa por olhar para a economia real e para um conjunto de problemas, da educação, à mobilidade, da saúde à habitação, que só podem ser solucionados “à escala de âmbito regional“.
“Quanto mais adiarmos a regionalização, mais atrasados ficamos. Há 20 anos o mapa era péssimo e o então líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, não concordava com as regiões. Agora o mapa é consensual, embora possa ser aperfeiçoado em Lisboa, e temos hoje o Presidente da República que volta a não concordar com a regionalização”, recordou Medina, questionando se perante este cenário se “mete a ideia na gaveta”. A resposta foi “não”, e “não é possível porque a realidade impõe-se”.
Em relação a prazos, Fernando Medina diz que, mais do que aprofundar a descentralização, os autarcas devem bater-se por um novo pacote de competências a transferir do Estado central para o poder local, ao mesmo tempo que é preciso convencer as populações das vantagens da regionalização até às próximas autárquicas, bem como “conversar mais com o Presidente da República”.
“Não vamos avançar até às presidenciais. Há vida para lá de janeiro de 2021”, sublinhou Fernando Medina, que advoga que o processo deve ser em definitivo refletido nos próximos dois anos, ou seja até ao final do mandato autárquico do mesmo ano.
Para o presidente da Câmara do Porto, que tal como o autarca de Lisboa não concorda que se avance já para as eleições diretas para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto por colocar em causa a regionalização, a divisão do país em regiões como foi concebida há 20 anos “era um nado morto”, sendo ainda vítima do mito “do papão de mais cargos políticos”.
“É pura demagogia”, garante Rui Moreira, que argumenta que nunca percebeu porque que é “que um cargo em Bragança ou Beja é um custo e um cargo na administração central é despesa da máquina do Estado sustentável”. O autarca independente fez ainda questão de recordar, que após o chumbo à regionalização, ficou a promessa da descentralização do país. “Nunca foi cumprida e os cidadãos têm hoje o rabo pelado de promessas”, afirmando que nunca o país foi tão desequilibrado, tão centralizado e macrocéfalo.
O autarca independente, à semelhança do autarca do PS, está convencido de que a caminhada para a regionalização do país que é dos menos descentralizados da UE é irreversível, mas que o passo em frente terá de ser dado pelos autarcas, avisando que não há “ovelha que se queira tosquiar”, numa alusão à máquina do Estado que “não se deixará tosquiar” sem resistência.
No debate, com sala cheia, os dois autarcas convergiram ainda que seria um erro avançar com eleições diretas para as presidências das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, desde logo porque “poria em causa a regionalização“, referiram os dois presidentes.
No debate no Rivoli, numa sala a rebentar pelas costuras e muito aplaudido no final, marcaram presença Jorge Nuno Pinto da Costa, Valente de Oliveira, Pedro Marques Lopes, a vereação da autarquia, deputados municipais e docentes da academia portuense. O frente a frente arrancou com a apresentação de um estudo encomendado pelo 'Porto, o Nosso Movimento' à Faculdade de Economia da Universidade do Porto, tendo concluído os autores do relatório 'Descentralização/Regionalização: O caso do Porto' que o calendário de transferências na descentralização é curso e o envelope financeiro escasso em algumas áreas.
O estudo conclui, também, que há necessidade de garantir níveis mínimos de equidade e de se refletir sobre o processo de descentralização “sem ignorar o modelo de regionalização”.