Manuel Ennes Ferreira

Wall Street e África

13 outubro 2008 8:00

13 outubro 2008 8:00

O que inicialmente parecia ser apenas uma forte turbulência nos mercados financeiros começa agora a fazer despontar, qual icebergue, a sua real dimensão.

A economia real não poderia deixar de ser afectada e as revisões em baixa do crescimento económico mundial não deixam praticamente ninguém imune. Houve quem pensasse, ingenuamente, que África poderia, enfim, beneficiar do caos instalado nos países de maior pujança económica. Ou seja, problemas deles. Para o bem ou para o mal, os países africanos não estavam tão enredados naqueles esquemas complexos.

Era uma visão optimista e ingénua de quem pensava que, afinal, alguma coisa de positivo existia na marginalização económica do continente. Mas a crise chegou e para todos.

Na África do Sul, a Bolsa de Joanesburgo que representa 80% da capitalização bolsista em África e que integra o "top" das bolsas mundiais (põe a de Lisboa num bolso), a queda tem acompanhado o desempenho negativo das bolsas mundiais.

Com restrições ao financiamento e crédito internacionais, também não vai ser fácil a vida em África. E os países africanos necessitam dele como de pão para a boca.

Os empréstimos privados a África, que tinham disparado a partir de 2004, certamente diminuirão. Isto significa dificuldades para os governos africanos e dificuldades para atrair capital estrangeiro.

A capacidade de contrair empréstimos por parte das grandes empresas estrangeiras que investem em África irá reduzir-se. Resultado: diminuição destes fluxos. Mas não é só por isso que eles irão diminuir.

Cerca de 85% do seu valor concentra-se em apenas dez país. Quais? Os produtores de matérias-primas, claro, com os de petróleo à cabeça. A excepção é, como sempre, a África do Sul.

Ora, o investimento estrangeiro poderá diminuir não só pelas razões indicadas mas também porque o preço das matérias-primas, dada a diminuição da sua procura, desmotivará novos investimentos.

O que não sendo boas notícias para as empresas investidoras ainda é pior para os países africanos.

Diminuirão as receitas de exportação e as receitas fiscais. Afinal Wall Street não é assim tão longe de África.

Manuel Ennes Ferreira

Professor do ISEG e "think tank" Grupo África-IPRI