18 dezembro 2009 0:01
18 dezembro 2009 0:01
No melhor pano cai a nódoa. Maria José Nogueira Pinto, uma mulher normalmente ponderada e que gosta de deixar nas televisões as suas tiradas moralistas sobre o funcionamento das instituições e o comportamento dos respectivos titulares, declarou-se surpreendida numa reunião da Comissão Parlamentar de Saúde, porque, como disse, "nunca tinha visto um palhaço permanente de uma comissão parlamentar". O "palhaço permanente" era um seu colega deputado.
Até agora, Nogueira Pinto tinha uma sinuosa carreira política ajustada às suas conveniências particulares de cada momento, na qual avultava uma piada atrevida: a de que até o rato Mickey era capaz de ganhar a Paulo Portas a liderança do CDS. Isto numa eleição que pôs o país político às gargalhadas, visto que a autora do chiste, também candidata à chefia do CDS, nem sequer esteve à altura do rato Mickey, perdendo fragorosamente para... Paulo Portas.
Com a cena desta semana, Nogueira Pinto fez um upgrade na sua intervenção pública: passou da graçola escarninha ao insulto baixo. Agora deputada pelo PSD, tornou-se autora da agressão verbal mais directa e ofensiva de que há memória no Parlamento desde o 25 de Abril. O visado considerou quase um elogio que lhe chamassem "palhaço", mas não se coibiu de acusar a interlocutora de "se vender a qualquer preço". Isto depois de ter passado três horas e meia de debate em apartes, que foram todo o seu contributo para os trabalhos de uma comissão parlamentar, na qual um terceiro deputado também usou o termo "esquizofrénico" para qualificar colegas seus. Tudo ao nível, portanto, de um Parlamento que diariamente aposta em degradar-se um pouco mais aos olhos do país inteiro. Por vezes com a ajuda de figuras exteriores, como o próprio primeiro-ministro, que não raro também se excede mais do que devia.
Quer o "deputado da província", que, pateticamente, se considerou vítima de uma luta de classes, quer a deputada 'bem' que se presume tão inimputável como o seu interlocutor, provaram que não têm a menor consideração um pelo outro. É lá com eles. O problema é que não têm também a menor consideração pelo cargo que desempenham e isso já é connosco. Não se vê como é que eleitos que não se respeitam uns aos outros podem merecer o respeito dos eleitores.
Para os senhores deputados que não sabem comportar-se, ou que perdem o verniz quando não devem, há uma saída digna e muito simples: tenham a decência de renunciar ao mandato. Assim, não envergonharão mais os eleitores e contribuintes que lhes pagam vencimento e mordomias.
Titulares pagam factura
Quan do se anunciaram os primeiros recuos do Governo no braço-de-ferro com os professores logo se percebeu que um dos problemas seria pôr fim à avaliação anterior sem provocar novas injustiças relativas. Ao acabar com os professores-titulares, Isabel Alçada não explicou imediatamente como iria reclassificar os que tinham sido classificados nesse escalão. A nova estrutura da carreira mostra agora que são esses titulares, ou muitos deles, quem vai pagar a factura.
De facto, contra o que seria lógico - e da mais elementar justiça - muitos desses professores que, antes de Maria de Lurdes Rodrigues, já se encontravam no décimo e último escalão, descem agora para o nono por não terem mais de 34 anos de trabalho. Pelo que se vai percebendo, o tempo de profissão passa a ser o factor determinante na evolução na carreira. E muitos dos que já estavam no topo voltam agora para trás, mudando-se as regras a meio do jogo, à semelhança do que se tem feito com a idade da reforma.
Primeiro, caiu a máscara aos sindicatos: recusando qualquer tipo de quotas nos escalões superiores, demonstraram que, de facto, não querem nenhuma avaliação por mérito, mas sim uma carreira 'contínua', como lhe chamam, sem obstáculos desde o topo até à base. Agora, vem o Ministério comprar a paz nas escolas desclassificando muitos dos que, ainda há três meses, considerava dignos de uma distinção especial. Vai acabar mal.
Uma bolsa sem fundo?
O Governo manteve o compromisso de aumentar o salário mínimo, mas, para isso, teve que dar contrapartidas às empresas: menos 1% de taxa social única em 2010 e, nos casos de dívida à Segurança Social, a possibilidade de a resolver em 120 prestações suaves. Quer dizer, parte do aumento do salário mínimo acaba por ser indirectamente suportado pela Segurança Social. Para conseguir cumprir um compromisso a que as confederações patronais também se tinham obrigado no acordo de 2006, o Governo teve agora de ceder facilidades não previstas nesse acordo. Isto quando a mesma Segurança Social tem que fazer um esforço gigantesco para responder à emergência de milhares e milhares de trabalhadores sem emprego que se vêem forçados a antecipar a reforma, ainda que com prejuízos enormes relativamente às suas expectativas legítimas.
Numa altura em que as receitas do Estado diminuem em resultado da crise, não há decisão política - mesmo a decisão já acordada de dar um aumento de 25 euros em 2010 a trabalhadores com salários de miséria - que não passe por contrapartidas que agravam cada vez mais as contas públicas. A pergunta que todos nos fazemos é a de saber até quando a bolsa do Estado pode suportar tudo isto. E onde está, ou como se manifesta em tempos de crise profunda, a tão badalada responsabilidade social das empresas.
Texto publicado na edição do Expresso de 12 de Dezembro de 2009