23 agosto 2009 8:00
23 agosto 2009 8:00
A Campanha de alfabetização de adultos dos anos 50 foi uma oportunidade para muitos adultos que precisavam da 4ª classe para entrarem num emprego ou pelo puro prazer de saber ler. Embora tenha resultado de uma acção política com o objectivo de levantar os índices de escolarização da população que estavam a envergonhar o país nas instâncias internacionais ela foi também ao encontro dos anseios das populações.
O povo aproveita as migalhas que caem da mesa da governação e quando pode também faz as suas pequenas corrupções.
Nesta campanha de 50 aproveitou os cursos nocturnos, mesmo com muito sacrifício, trabalhando de sol a sol, mal alimentado e a viver em casas sem condições de higiene e saúde.
A vontade de aprender foi mais forte. Aqui fica um testemunho:
Eu sou um pobre homenzinho
Não me canso de dizer;
Tenho vista e sou ceguinho
Sou cego pois não sei ler
Vejo à esquina editais
Tendo muitas, muitas letras
Quer sejam brancas ou pretas,
Todas para mim são iguais
As notícias dos jornais
Em me encontrando sozinho
Que não tenha um amiguinho
Que me leia com afecto:
Sou um triste analfabeto,
Eu sou um pobre homenzinho
Chega o carteiro da aldeia
Com uma carta na mão
Até sinto aflição
Por pedir a quem ma leia.
É uma acção muito feia
Termos de dar a saber
A carta pode trazer
Algum segredo encerrado.
Fica logo divulgado
Não me canso de dizer.
Se vou à noite ao cinema
E a fita for estrangeira,
Ali estou numa cadeira
Tendo só desgosto e pena.
Vejo muita, muita cena,
Mas só vejo bonequinhos;
Gastei o meu dinheirinho,
Foi tolo este meu desejo;
Julgava ver e não vejo
Tenho vista e sou ceguinho.
Viva a escola do Sobral,
Viva o Senhor Professor,
É digno de louvor
Por muito aluno ensinar.
Sempre, sempre a trabalhar
Sem nunca se aborrecer
Faz adultos aprender
É também muito feliz.
Só é pobre hoje quem diz:
Sou cego pois não sei ler
Sebastião Pinto, aluno da 4.ªclasse do Curso de Adultos de Sobral da Adiça
A Campanha, n.º32, Abril, 1956
Joviana Benedito Profª. aposentada do Ensino Sec. e autora