Joviana Benedito

Ciberviagens ou as novíssimas viagens (7)

13 junho 2008 8:00

13 junho 2008 8:00

O Vaticano com som de Nana Mouskury

Não me inscrevi numa peregrinação, não fiz a mala, não tomei o avião. Apenas abri um e-mail que me chegou. Neste caso voltei aos passos que já tinha dado na realidade.

Deslumbrantes as imagens, harmonioso o som, nítidos os pormenores.

Ver tantos turistas fez-me reviver e sentir a multidão que todos os dias se aglomera para entrar, que se acotovela para andar mais depressa ou mais devagar, uns com os olhos grandes de curiosidade outros em postura de devoção, mas todos sedentos das informações dos guias.

Vi muito melhor os pormenores das esculturas e da pintura nas imagens do pps incluído no e- mail do que vi na visita real. E as vistas aéreas deram-me uma perspectiva do conjunto muito mais perfeita também.Estas duas formas de viajar complementam-se, quer a viagem virtual se faça antes ou depois da viagem real.

A viagem real fica na nossa memória afectiva, construímos laços com o que visitamos, maiores ou menores segundo a nossa experiência de vida e desejo de visita.

Para pessoas com interesses culturais, ou outros, qualquer viagem pode ter três partes, o antes, o durante e o depois ou seja a preparação, a realização e a conclusão. O antes em que entramos em contacto com aquilo que poderemos visitar, o durante em que nos deliciamos com a visita real, em que tiramos fotos para guardar em memória o que mais nos tocou, e o depois em que vamos rever tudo para recomeçarmos outra viagem, quem sabe, apenas imaginária.

A este propósito lembrei-me de um bonito parágrafo de Saramago: "A viagem não acaba nunca. Só os viajantes acabam. E mesmo estes podem prolongar-se em memória, em lembrança, em narrativa. Quando o viajante se sentou na areia da praia e disse: "Não há mais que ver", sabia que não era assim. O fim duma viagem é apenas o começo doutra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na Primavera o que se vira no Verão, ver de dia o que se viu de noite, com Sol onde primeiramente a chuva caía, ver a seara verde, o fruto maduro, a pedra que mudou de lugar, a sombra que aqui não estava. É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir. E para traçar caminhos novos ao lado deles. É preciso recomeçar a viagem. Sempre. O viajante volta já."

José Saramago, Viagem a Portugal, 1986

Joviana Benedito

Profª. aposentada do Ensino Sec. e autora