Luis Pedro Nunes

Ir a Marrocos e não ver camelos

20 outubro 2010 0:00

Luis Pedro Nunes (www.expresso.pt)

O La Mamounia voltou a ser o símbolo do luxo de Marraquexe cosmo-chic. Eis como fui levado.

20 outubro 2010 0:00

Luis Pedro Nunes (www.expresso.pt)

Avancei para as ostras do buffet de domingo do pavilhão da piscina que fica no meio do jardim de oito hectares do hotel que fica na Medina da cidade perto do deserto ali encostado às montanhas. A meu lado, o ex-presidente do Líbano Amime Gemayel ria divertido e descontraído com o seu grupo de mulheres de nariz talhado e lábios inchados pelo colagénio. Pelo menos aqui os guarda-costas parecem relaxados. Os empregados impecavelmente de branco, habituados a servir Scorseses, Rolling Stones, Nicoles Kidmans, Sarahs Jessicas Parkers e todo o tipo de estrelas, excêntricos ricos e VIP globais, mostraram alguma excitação: numa mesa algures estava um qualquer antigo jogador do Real Madrid. Esta é mesmo a realeza do século XXI.

Mais ao fundo uns camaradas borlistas como eu - a equipa da "Vanity Fair" - também atacava o brunch do La Mamounia, o mítico hotel de luxo de Marraquexe que reabriu há precisamente um ano após um makeover de 150 milhões de euros e que se permite a ter jornalistas convidados non stop. Entretanto, chegou-me um SMS. Era R. que estava com J. e N. - ambas marroquinas. Convidavam-me para um café. M. tinha estado a almoçar com Hermès que irá participar na organização da Semana de Moda de Marraquexe. Tinha passado a noite em clubs high society - um mix de franceses endinheirados que reencontraram o sentido da vida e marroquinas herdeiras lindas de mini-minissaia que dançam a olhar para o ombro conscientes de si - e não seria desta vez que teria a minha foto com a cobra drunfada no tal famoso mercado central.

Eis a minha história no La Mamounia. Um dia Henrique Monteiro, na sua infinita sabedoria, considerou que eu daria o garboso metrossexual da Única. Eis porque fui recebido por um motorista fardado de cinza, num dos jaguares bordeaux da frota da "Grande Senhora" de Marraquexe. E colocado numa das melhores suites: o closet é maior que a minha cozinha e todos os objetos lá dentro são de madeira nobre ou couro trabalhado à mão, as duas varandas a escancarar para os jardins de 200 anos que exalam um bafo colorido mas de predominância de laranja brava. A casa de banho em mármore e várias divisões é o nosso spa pessoal. Foi aí que me baixou o rancor de não me terem colocado num dos riads privado no meio do jardim... Enfim... serviria.

Num jantar com o diretor do hotel foi-me dito que os portugueses são clientes de nicho no La Mamounia. Mas, brevemente, para a semana, acho, irá receber outro jornalista de um diário de referência português (ótimo! Rapaz: descreve por favor os detalhes de luxo do hotel). No bar Churchill, em honra a um dos mais famosos hóspedes, disse algumas baboseiras em alta voz com amigos. Só depois reparei que estava sentado ao lado de hóspedes portugueses... A falta de chá paga-se.

De um lado do espetro está o viajante tipo Bruce Chatwin. Do outro este tipo de experiência. Não se podem comparar. O espírito do La Mamounia leva-me ao colo põe-me no spa, nos banhos árabes, dentro de uma limo com um guia que fala português a um kasbah de luxo no Atlas. E não me venham dizer que só o que é bom é levar tareias de camionetas e cheirar a suor. Fui repórter muitos anos. Passei muitos e muitos dias sem tomar banho. É outra narrativa para se contar aos amigos. Ah, e a outro preço, têm razão.

O La Mamounia é o coração da sofisticação de Marraquexe. É um cliché dizer que Marrocos é um país a duas velocidades. Só que já há uma classe média a despontar, pois o país cresceu 5% em ano de crise planetária. Mas no que respeita a luxo, os marroquinos sabem da parra. E este setor é como na F1: luta-se por milésimos de segundo e Marraquexe e o La Mamounia, no meio do nada, com 50º no verão, atrai a nata mundial há quase um século.

E regressei a Lisboa, essa cidade terceiro-mundista, caótica, barulhenta, na bancarrota e de gente triste e maldisposta - agora e na hora das vacas gordas e ainda por cima esta semana, com um tempo de cão. A ver se passo no Rossio para tirar uma foto com um local, mesmo sem serpente.

É um dos mais famosos, luxuosos e carismáticos hotéis do mundo. Desde filmes de Hitchcock a palco de míticos cocktails de YSL, o Mamounia é um dos símbolos do cosmo-chic de Marrocos. A TAP, a Royal Air Maroc, a Easyjet e a RayanAir têm inúmeros voos semanais diretos para Marraquexe. Já os preços do La Mamounia necessitam de músculo. São €600 a diária mais barata e €1400 a suite e €8000 o riad do jardim. É ver o site...

Texto publicado na revista Única de 16 de outubro de 2010