Numa democracia participativa e saudável, é desejável que o debate envolva a sociedade civil, não negligenciando os especialistas e o conhecimento científico. Respeitamos a missão da comunicação social, surpreendendo-nos a irresponsabilidade da catadupa de artigos de opinião publicados nos últimos dias. Fazedores de opinião, activos regularmente na comunicação social, devem ter a seriedade de “arregaçar as mangas” pesquisando honestamente sobre a evidência da eficácia das medidas de saúde pública anunciadas pelo Governo, verificando a incongruência dos seus argumentos, à luz dos direitos humanos e do direito à proteção da saúde e bem-estar público. O mesmo se aplica a ex-governantes e membros do Parlamento que se preparam para “aligeirar a Lei”, ilustrando assim a complexa teia existente.
Entendemos que só assim pode ser prestado um bom serviço de cidadania e informação responsável, respeitando os portugueses, o direito à saúde e à informação fundamentada, imparcial e objetiva. É de realçar, que as posições sobre a supremacia da “liberdade individual e de livre escolha” que varreram os media contradizem um direito humano fundamental - o direito à saúde - e ao bem-estar público, que estão consagrados e moldam a liberdade individual na Declaração Universal dos Direitos Humanos, Constituição Portuguesa, Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (UE), e Tratado da Constituição da OMS.
Profissionais de saúde, investigadores, jornalistas e políticos, pelo compromisso profissional com a causa pública, devem unir forças, informando e capacitando a população para promover a saúde, através da educação eficaz e de políticas robustas de saúde pública.
Como médicos, testemunhamos o sofrimento causado pelo tabaco e a dificuldade que os fumadores têm para cessar o consumo dum produto legal, aditivo e letal. Assim, a maioria dos fumadores adia cessar, adoecendo ou morrendo precocemente (2/3) nos grilhões duma indústria que vicia para lucrar.
Mas o fumo do tabaco também causa dano aos não fumadores. Daí a importância das políticas públicas de tabagismo, protegendo crianças, grávidas, trabalhadores e não fumadores da exposição ao fumo, prevenindo a iniciação tabágica dos jovens, promovendo a motivação e apoiando as tentativas dos fumadores para cessar, aumentando a eficácia dos programas de tratamento, e mudando a norma social. E porque a profissão médica abraça uma responsabilidade social maior do que apenas tratar doentes, escrevemos aos leitores do Expresso. Não vamos opinar, nem reagir “instintivamente”.
O controlo de tabagismo, amplamente estudado em vários países, é considerado o exemplo de ouro da evidência científica aplicada em saúde pública, sendo necessário reforçar as medidas de acordo com a evidência mais atualizada e o marketing emergente da indústria. No momento em que escrevemos este artigo contactam-nos colegas internacionais colaboradores da OMS, de Organizações Europeias de Saúde e da Comissão Europeia, aclamando as medidas aprovadas pelo Governo de Portugal, atentos aos desenvolvimentos da negociação política, disponibilizando apoio para contornar a resistência a estas medidas.
Explicaremos detalhadamente, numa fonte abrangente da comunicação social, as medidas aprovadas pelo Governo, que agora seguem para discussão parlamentar. Convictos de que os portugueses exigem boas políticas públicas de promoção de saúde e um jornalismo de qualidade que sirva as causas públicas, não vamos baixar os braços.
* Sofia Ravara, Paulo Corrêa e José Calheiros são médicos, professores universitários, investigadores e peritos em controlo de tabagismo; colaboradores da OMS e de organizações internacionais de saúde
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