Opinião

Grace Bumbry

19 maio 2023 2:56

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1937-2023. Seria lembrada como uma extraordinária cantora de ópera não se desse o caso de ser negra num meio que tanto a adorou como a quis rejeitar por isso

19 maio 2023 2:56

Toda a gente parece querer ser primeira em tudo, quer trabalhando de forma honesta para isso, quer confiando na inteligência para perceber em que momento é possível ser pioneiro. Em ambos os casos parece haver racionalidade — por esforço ou faro a coisa há de acontecer. Ser o primeiro homem a separar gémeos siameses ou ser a primeira mulher a governar um país são exemplos que nos parecem resultar do esforço individual, mas teremos de conhecer as vidas destes exemplos para perceber se houve características menos tangíveis que levassem os “primeiros” a sê-lo, como a sorte ou a excecionalidade.

A mezzo-soprano Grace Bumbry foi a primeira mulher negra a apresentar-se no Festival de Bayreuth, como a Vénus no “Tannhäuser”, de Wagner. Este instante primordial aconteceu em 1961 e é descrito com ­maior ou menor detalhe nas notas bio­gráficas e nos obituários da cantora de ópera norte-americana. O que a tornou “primeira” não foi, nesta descrição, resultado do esforço — apesar de ser aos 23 anos uma cantora tão extraor­dinária que o neto de Richard Wagner, Wieland Wagner, o codiretor do festival, a escolheu. Embora ser mulher não fosse invulgar no meio — ao contrário do que seria na política na mesma década em qualquer país do mundo civilizado —, a diferença estava na cor da pele.