Opinião

As Causas: 25 de Abril. Reflexões no Dia da Liberdade

A comemoração do 25 de abril ficou desnecessariamente marcada pelo disparate do convite a Lula para discursar

Gosto muito de juntar informações que habitualmente nos chegam separadas, que não integramos em sistema e a que por isso não damos o significado total que possuem.

Mais uma vez o tentarei fazer, hoje de modo ainda mais oportuno por ser comemorado o “Dia da Liberdade”, que não se queria esgotar na criação da Liberdade Política (com todos os seus defeitos continua a ser um caso de sucesso).

O Dia da Liberdade também serve para comemorar a Liberdade Económica, Social e Cultural, e nesses planos estamos bem pior do que poderíamos estar.

Mãos ao trabalho, então, começando por agregar informações dispersas.

A NECESSIDADE DA LIBERDADE ECONÓMICA

O “Economist” realçou há algumas semanas que os EUA estão a aumentar a diferença em relação às outras economias mais ricas a um ritmo crescente nos indicadores relevantes. Apenas dois exemplos.

O PIB dos EUA desde 1990 passou de menos de 40% para 58% do total dos países do G7, os mais ricos do Mundo. Ou seja, um aumento de 45%. E a nível mundial, apesar do explosivo crescimento das economias asiáticas, os EUA continuam a representar 25% do BIP Mundial. Quem perdeu terreno? A Europa.

Devido também à imigração, mais generosa do que na Europa, a população em idade produtiva (25 a 64 anos) cresceu no mesmo período de 32 anos muito mais que na Europa (38% vs 9%) e os nessa faixa etária que estão ativos cresceram 30% (Europa 13% e Japão 7%).

Nesse contexto, é muito ilustrativa a comparação em mapas entre os EUA e a Europa, no que se refere ao crescimento do PIB nos últimos 25 anos, sendo que o núcleo mais rico da Europa compara muito mal (e Portugal, Itália e Grécia ainda muito pior) com os EUA:

Outra informação: Um estudo feito pela NOVA-IMS para a BRP (uma associação de grandes empresas, liderada por Vasco de Mello) revela que entre 2016 e 2019 elas apresentaram um VAB (Valor Acrescentado Bruto) médio que é 10 vezes superior ao de uma empresa média.

A nível salarial, as grandes empresas pagaram (incluindo contribuições) uma média de 30.900 euros por trabalhador, mais 30% que as médias e mais 70% que as pequenas.

No que respeita ao investimento em projetos de investigação e desenvolvimento (I&D), nesse período, o investimento das grandes empresas foi 6 vezes superior em média face ao investimento das médias empresas.

Mas, segundo revela o “ECO”, citando o INE, empresas integradas em grupos multinacionais em 2021 geraram 83% do VAB total das empresas em Portugal, o que revela que não temos centros de decisão fortes e independentes como seria necessário à nossa independência estratégica.

Como resumo, concluo que devemos buscar inspiração nos EUA, precisamos muito de mais grandes empresas e de empresas portuguesas com dimensão.

A NECESSIDADE DA LIBERDADE SOCIAL

Agora mais outros factos a interligar com os anteriores.

Como venho dizendo há anos, Portugal não tem uma forte e sólida classe média e isso resulta do brutal peso dos impostos, designadamente sobre o rendimento. Apenas três exemplos, que retiro de um texto de João Silvestre no Expresso.

Para ter direito ao acesso à “renda acessível” (como é óbvio, este não é um indicador de classe média) pode ter-se um rendimento de 4000 euros por mês por casal, o que corresponde ao percentil 80 dos salários, sendo que isso devia corresponder ao setor de classe média-alta, pois a média nacional do percentil é 40.

O percentil 90 (típico de classe alta) atinge-se com € 2700 (mês) e o percentil 95 com €3600 (mês), mas depois de impostos e contribuições sobram-lhes, respetivamente, €1700 e €2200.

Ou seja, ganhar isto é ser rico em Portugal.

Como disse o Presidente da BIAL, em entrevista recente ao “DN”, “Queixo-me do IRS. Pagamos salários justos e as pessoas recebem salários injustos”.

Outro facto: uma sondagem recente revelou que a queda abrupta do PS e do apoio a António Costa resultou sobretudo do afastamento dos pensionistas. Sabendo disso, o Governo decidiu de surpresa aumentar as pensões de novo em 2023, e assim criando um ónus permanente anual de mil milhões de euros para o sistema da segurança social, que há meses achava incomportável.

O Programa de Estabilidade revelado na passada semana, num momento de coragem e seriedade, confirma que para se estar no grupo dos 10% mais ricos em Portugal basta ter um rendimento de €30 000 anual (pouco mais de €2000 por mês, e antes de impostos e contribuições).

Pouco depois das eleições de 2022, Fernando Medina confessou-me que os focus group de potenciais jovens eleitores do PS colocavam a redução dos impostos como a sua maior prioridade política.

Agora que, segundo o “DN”, o Ministro das Finanças, no Programa de Estabilidade, “promete o segundo maior corte da carga fiscal de que há registo”, acho que posso revelar o que – aliás sem me pedir segredo – me referiu.

Finalmente, como referi na passada semana, Portugal desde 1999 até (previsão) 2026, somos e seremos em crescimento do PIB o pior País da União Europeia (depois da Grécia e Itália) e o 13º pior do Mundo.

Ou seja, e em resumo, volto a repetir o que digo há anos: para sair do atoleiro precisamos de um choque fiscal.

DILEMAS DA DEMOCRACIA

Não é preciso ser um génio para constatar que o sistema económico-social dominante em Portugal há décadas nos arrasta para a cauda da Europa, para a emigração de talento jovem, para a estagnação e para a dependência terceiro-mundista do Estado de cada vez maiores camadas de população.

Vivemos em Democracia, a maioria dos que votam preferem que seja assim, não se importam de cair no assistencialismo pois sabem que basta uma sondagem má para o Governo para que se reforcem os mecanismos de assistência e dependência da vontade do Poder Político.

Vejam o caso do aumento das pensões (compensação de metade do aumento do ano seguinte no Outono de 2022 e pagamento de 100% em 2023), que como é evidente se não pode dizer que não seja necessário.

O problema é que baixar o IRS das classes médias é ainda mais essencial se pensarmos a algo mais do que a curto prazo. E quem paga afinal o aumento das pensões são os que pagam impostos diretos e indiretos, sobretudo os que têm rendimentos médios.

O milagre do aumento da produtividade não existe e vai piorar com a evolução demográfica. A brutal carga fiscal sobre as classes médias e os trabalhadores (ainda que com rendimentos elevados) não ajuda a criar riqueza e faz drenagem de jovens com talento para fora.

Reconheço que ninguém gostará de ouvir, mesmo de um reformado como eu, o que acho apesar disso que devo dizer:

Vivemos um dilema: com recursos escassos quem favorecer? Favorecer (comparativamente) os reformados e os funcionários públicos – que votam muito e por isso assustam com facilidade os governos? Ou favorecer as novas gerações de trabalhadores ativos qualificados - que pagam muito IRS, consomem muito com IVA, pagam juros de empréstimos ou rendas de casa que a escassez de investimento torna mais caros?

Acresce que a esmagadora maioria destes últimos trabalha na iniciativa privada, não recebem do Orçamento do Estado, mas de empresas que não podem pagar mais por não terem as vantagens do Estado e poderem fechar por insolvência.

A situação é dilemática e só não vê quem não quer ver. Sem a válvula de escape da emigração já teríamos soluções opostas para escolher.

Assim, o círculo vicioso do empobrecimento será cada vez mais o motor que comanda a economia para o abismo. E quem sair no fim que feche a porta.

VENTURA E SANTOS SILVA: NOVOS SIAMESES

A comemoração do 25 de abril ficou desnecessariamente marcada pelo disparate do convite a Lula para discursar hoje.

Os únicos vencedores desse erro foram André Ventura e Augusto Santos Silva, como acontece há meses de forma estrategicamente repetida. Ambos estiveram mal neste dia.

Como é óbvio, discordo da opção do CHEGA na cerimónia, mas ele não estava a agir em relação a pessoas que se posicionam como eu. Não ia desaproveitar o “petisco”…

Seja como for, merece realce que, depois de Dilma Rousseff e de Jair Bolsonaro, haja de novo um presidente que genuinamente gosta de Portugal.

Isso nada desculpa os seus erros, a forma como compactuou (pelo menos…) com a corrupção, a sua manifesta impreparação para as ambições que possui. Mas para Portugal é essencial o Brasil. Só é pena que Lula não tenha discursado no dia 23 ou 24 de abril, poupando-se o infeliz espetáculo que pudemos ver pelas televisões.

ELOGIO

A precipitação entusiasmada de Marcelo arranjou um problema desnecessário com o convite feito a Lula para vir discursar na cerimónia do 25 de abril.

Como todos os grandes políticos, corrigiu um erro sem o confessar. A forma como afirmou os valores europeus em relação à Ucrânia na presença do Presidente do Brasil merece elogio. E além disso fez o discurso certo para o 25 de abril, sobretudo ao realçar que houve vários vencedores incompatíveis e o 25 de abril é de todos.

Espero que estes elogios o acalentem um pouco na semana em que saiu uma sondagem com grande queda da sua popularidade, pois o saldo positivo passou dos 46% de Dezembro de 2021 para apenas 7% agora.

LER É O MELHOR REMÉDIO

Na passada semana chamei Oscar Wilde a Mark Twain. Um amigo divertido disse que eles tinham muito sentido de humor e não se zangariam.

Será assim, mas isso é parte do problema: estou a vê-los, no Céu dos grandes escritores, a beber absinto e a rirem-se de mim.

Para os aplacar – e sobretudo para compensar quem me ouviu – sugiro a leitura de duas obras de grande literatura que escreveram:

As Aventuras deHuckleberry Finn” (Mark Twain) e “O Retrato de Dorian Gray” (Oscar Wilde) fazem parte do meu “cânone” da Literatura Universal.

Assim sendo, com renovado pedido de desculpas, posso afinal afirmar que “há males que vêm por bem” ou, como se diz agora, “vai tudo acabar bem”…

A PERGUNTA SEM RESPOSTA

Foram comemorados os 50 anos de vida do PS, num momento muito complicado para o partido que Mário Soares fundou e que merece parabéns pelo papel essencial que sobretudo com ele desempenhou na luta pela Liberdade, antes e depois do 25 de abril.

O que mais me impressionou, valha a verdade, foi a ausência de António José Seguro nas comemorações.

Não é surpresa que ele nunca perdoou a António Costa a frieza com que este o afastou (aliás democraticamente) da liderança após ter ganho as eleições europeias e apesar disso.

Mas impressionou-me não haver sinal de um esforço aparente para que ele estivesse presente no que seria a melhor ocasião para o PS contrariar as crescentes críticas internas, cada vez mais audíveis.

E também me impressionou que – com exceção de Manuel Alegre e da recuperação de Pedro Nuno Santos no modelo “volta, estás perdoado” - nenhum destaque tivesse sido dado a figuras que ao longo décadas fizeram o grande partido da democracia portuguesa.

As perguntas são simples e óbvias: Porquê a visão “caudilhista” que perpassa? Para quê tudo focado em Costa? Será por causa da avaliação do atual líder pelos portugueses desde abril de 2022 ter passado de 24% positiva para 27% negativa?

A LOUCURA MANSA

Deus enlouquece primeiro aqueles que quer destruir”, disse Eurípedes no século V antes de Cristo. E continua a ser verdade.

Foi realmente penoso ver duas ministras a argumentar por que razões não seria possível enviar o parecer jurídico sobre a demissão do Chairman e da CEO da TAP e a seguir outro Ministro a afirmar que não há pareceres nenhuns sobre o tema.

E penoso foi também o Primeiro-Ministro não achar que os portugueses tenham direito a saber se andam todos tontos ou se Medina está a mentir.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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