Mensagens políticas claras
Na entrevista, o líder do PSD quis deixar mensagens estritamente políticas, relacionadas, nomeadamente, com o posicionamento e a estratégia eleitoral do partido
Advogado, presidente do Conselho de Jurisdição Nacional do PSD
Na entrevista, o líder do PSD quis deixar mensagens estritamente políticas, relacionadas, nomeadamente, com o posicionamento e a estratégia eleitoral do partido
Se se quiser ser minimamente isento na apreciação, haverá que reconhecer que a entrevista concedida por Luís Montenegro a um canal televisivo, na passada sexta-feira, foi um momento politicamente bem conseguido.
É certo que, para não variar, o Partido Socialista, pela voz do seu secretário-geral adjunto, apressou-se a vir dizer que o líder do PSD evidenciou, uma vez mais, falta de propostas para o país. Mas esse é um argumento que, por mais vezes que seja repetido, já não pega, tal é a evidência de que se trata, apenas, de um “slogan”.
A este propósito, recordo um episódio parlamentar ocorrido, creio, pelo ano de 2001, que não resisto a contar. Era presidente do PSD Durão Barroso e líder parlamentar do PS Francisco Assis – pessoa de quem tenho, aliás, a melhor das opiniões, no domínio ético, intelectual e político.
Na mesma linha, Francisco Assis acusava sempre Durão Barroso de idêntico mal – o vazio de ideias do PSD. Até que um dia, cansados de ouvir sempre a mesma coisa, combinámos – eu era, à época, seu chefe de gabinete -, que, da próxima vez que tal sucedesse, Durão Barroso iria munido de um exemplar autografado do programa eleitoral do partido e, em pleno hemiciclo, lhe faria oferta dele.
Inevitavelmente, aconteceu! E Durão Barroso fez aquilo que tinha sido acertado. Risota geral no Plenário. O Francisco Assis, pelo seu lado, “encaixou” com elegância, como é seu timbre. Mas o certo é que, a partir daí, o argumento foi desaparecendo.
Se Luís Montenegro, seguindo esse exemplo, coligisse e enviasse ao secretário-geral adjunto do PS – e, também, a muitos membros do Governo - uma lista das propostas do PSD na Saúde, na Educação, na Habitação e em tantas outras áreas, talvez aquele reconhecesse, finalmente, que está a faltar à verdade e mudasse de discurso. Porque uma coisa é discordar das ideias dos outros e outra, bem distinta, negar que elas existam.
De todo o modo, a crítica em questão nem sequer tem, no caso concreto, qualquer sentido, porque toda a entrevista tem - ou, ao menos, deve ter - um propósito. E, nesta, o líder do PSD quis deixar mensagens estritamente políticas, relacionadas, nomeadamente, com o posicionamento e a estratégia eleitoral do partido. E mensagens claramente direcionadas.
Em primeiro lugar, ao Presidente da República. Uma vez que as intervenções pouco felizes deste se vão somando, Montenegro sublinhou várias coisas importantes. Que, ao contrário do que Marcelo Rebelo de Sousa vem dizendo, o PSD é alternativa e que, se necessário fosse, amanhã estaria em condições de assumir a liderança do Governo. E, numa crítica direta, sublinhou que não espera que o Presidente da República seja nem ajudante do PSD nem óbice ao caminho que só ao partido cabe definir.
Em segundo lugar, a António Costa, enfatizando que, ao contrário do que este fez, não irá subverter regras e práticas bem estabelecidas, só para garantir o seu futuro político. E daí a afirmação, perentória, de que só será primeiro-ministro se ganhar as eleições.
Por fim, aos partidos à direita do PSD. Afirmando que o seu desígnio, legitimamente assumido, é obter uma maioria absoluta. Mas, se tal não for conseguido, pré-anunciou que, ao contrário do que sucedeu em 2015, os portugueses não acordarão para um governo que não escolheram e de cuja possível formação nunca qualquer indício lhes tenha sido dado.
Daí a indicação de disponibilidade para avaliar um possível entendimento pós-eleitoral com a Iniciativa Liberal e com o CDS, caso este regresse ao Parlamento. E a renovada manifestação de indisponibilidade para governar – ou, sequer, para aceitar acordos políticos – com racistas, xenófobos, oportunistas, demagogos, populistas e – o que me pareceu um delicioso pormenor – com imaturos e irresponsáveis.
Quebrado ficou, assim, o (suposto) tabu em torno das relações com o Chega, logo alguns se apressaram a dizer.
Mas não sei se o afirmaram por distração ou por ignorância, porque o compromisso assumido por Montenegro – porque é disso que verdadeiramente se trata, a meu ver -, mais não é do que a reafirmação do que já tinha dito logo no discurso de encerramento do Congresso de julho do ano passado. Cito, textualmente, as suas palavras: “Se algum dia for confrontado com a violação dos nossos princípios e valores, por forma a suportar um governo, o partido pode decidir o que quiser, mas não serei eu o líder de um governo desses.”
Embora o nome do seu partido nunca tenha sido pronunciado, André Ventura enfiou a carapuça (o que acaba por se traduzir numa confissão de que, afinal, lhe são mesmo aplicáveis os qualificativos utilizados por Montenegro…). E, vendo o chão fugir-lhe debaixo dos pés definitivamente, optou pela fuga para a frente, anunciando que o Chega, até ao final do primeiro semestre de 2024, vai ultrapassar o PSD nas sondagens. Se o ridículo matasse…
Em suma: propostas governativas alternativas e estratégia política clara é o que Luís Montenegro oferece. Com ele, portanto, os eleitores não irão ao engano. Como foram com Costa, com os resultados que, infelizmente, estão cada vez mais à vista.
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