As sociedades modernas exigem cada vez mais literacias diversas e penalizam fortemente os indiferenciados sem curriculum formativo. Por isso é uma tragédia o que está a acontecer na escola pública em Portugal. Nos anos formativos, os jovens são pouco socializados para o esforço, para o estudo, para a formação
Hoje os temas são os sucessos ou a necessidade deles.
Não nos iludamos, no entanto. O sucesso exige muito esforço e por vezes o de uns é o insucesso de outros. Mas também pode não ser assim, pode não ser um resultado de soma zero.
A EDUCAÇÃO COMO ELEVADOR SOCIAL
As conversas ocasionais com desconhecidos muitas vezes abrem-nos a outras realidades, recordam o passado e fazem-nos pensar.
Na loja onde compro jornais, e onde se respira sempre simpatia e convivialidade, acabei a conversar com alguém com muito sentido de humor, ao que não consigo nem quero resistir, e a certa altura ele disse-me que já leva 45 anos a trabalhar, tendo começado com “a licenciatura da 4ª classe”.
Daí rapidamente passou a falar de alguns jovens de hoje que não querem estudar, não se interessam, comparando com o que ele teria muito desejado fazer e não conseguiu.
No fundo, recordou, hoje os jovens têm muito mais coisas – o que é excelente – mas muitos não dão valor ao estudo.
A primeira lição que retiro é sobre a alma humana, e quanto isso creio que pouco se pode fazer: desvalorizamos o que temos à disposição e no fundo queremos o que custa ou é inatingível.
Essa dessincronia não é má em si, pois da insatisfação que dela nasce resultam histórias de realização pessoal e profissional, como me pareceu ser o caso do meu interlocutor, e em geral é também por isso que “o mundo pula e avança”, como cantou Gedeão.
A segunda lição é que nesses tempos, que conheci bem, a falta de estudos e de literacia não impedia o sucesso profissional.
É verdade que dificultava muito sobretudo aos mais desfavorecidos, que não beneficiavam do sistema da “cunha”, o que me lembrou o caso de colegas com quem fiz a escola primária pública numa zona muito pobre de Coimbra, a “Alta”, quase todos “licenciados com a 4ª classe”, mas então podia furar-se e subir no elevador social sem estudos.
Hoje tudo é diferente: quem não progrida nos estudos, através do aprender a “ler, escrever e contar” e de todo o muito maravilhoso que daí nasce e se acumula, tem o destino traçado de descer na escala social e na realização profissional, seja qual for a situação dos seus pais.
As sociedades modernas exigem cada vez mais literacias diversas e penalizam fortemente os indiferenciados sem curriculum formativo.
Por isso é uma tragédia o que está a acontecer na escola pública em Portugal. Nos anos formativos, os jovens são pouco socializados para o esforço, para o estudo, para a formação.
Pelo contrário, são sujeitos a quebra de regularidade nas aulas e muitos professores focados nas suas legítimas lutas sindicais pouca dedicação – a de que beneficiei nos anos 50 e 60 do século passado – lhes conseguem dar.
E, sem corar de vergonha, o líder do STOP disse há dias que “as greves não prejudicam os alunos”, o que bem simboliza a sua política de terra queimada.
E, pior do que tudo, um governo que deveria acreditar no elevador social e por ele construir o nosso futuro coletivo está por atos e omissões a dar cabo do ensino para os mais desfavorecidos.
Por causa disso tudo e contra isso, é cada vez mais essencial o esforço de Cidadania no ensino e na educação, de que são paradigmas tantas entidades privadas como a Escola 42 e a TUMO (que arranca na minha Coimbra), ambas nascidas da visão de Pedro Santa Clara, a EPIS e tantos professores que no ensino público continuam a resistir e a concretizar o belo sonho de ensinar e educar.
Para isso é essencial que os media, a começar pelas televisões, não falem só de greves e manifestações de professores e dediquem espaço e tempo a falar dos casos de sucesso no ensino.
Por exemplo, devia falar-se da famosa Michaela Community School, escola pública (no sentido europeu) na muito desfavorecida zona norte de Londres, para alunos dos 11 aos 18 anos, que tem elevados graus de exigência, muito rigorosas regras de comportamento e … mais sucesso do que as famosas privadas.
A foto que surge nos vossos ecrãs é reveladora, sobretudo em Portugal onde as fardas são consideradas sinal de, pelo menos, fascismo.
Como revelava o Economist há semanas, é uma escola com lemas, entre os quais “Eu sou o SENHOR do meu destino”, “trabalha duramente e sê generoso, sobretudo quando é difícil”, ou “Private School Ethos—No Fees”.
O grau elevado de exigência no seu ensino tem resultados excecionais: apesar de 25% dos estudantes serem muito desfavorecidos (a ponto de a escola ter de lhes assegurar a alimentação), mais de 75% atingem nos exames finais aos 18 anos os graus A e A+, os mais elevados, a escola é classificada pela inspeção estatal como “outstanding” e na medição do valor acrescentado é considerada a melhor escola do país.
Mas estes exemplos revelam que pode haver resultados que não são de soma zero, em que todos ganhamos.
PSD: FAZER PELA VIDA SEM O CHEGA
Quem está a ter sucesso é o CHEGA. E não falo apenas das sondagens que lhe atribuem grande aumento em relação às legislativas de há um ano (onde alcançou 7,18%), chegando na mais recente a 14,2%.
Como foi consensual na análise feita pelos media, no recente Congresso não houve divergências, ouviram-se menos vozes ultrarradicais, os temas fraturantes do passado (castração química, ciganos, prisão perpétua, etc) não estiveram em evidência, e a presença de representantes do PS e PSD ao mais alto nível foi interpretado como um começo da sua integração “normalizada” no sistema político.
Isto encantou alguns e assustou outros e daí foi um passo para se antecipar o apoio do CHEGA a um futuro governo liderado pelo PSD ou até que o integre.
Que fique claro, no entanto:
em minha opinião isso nunca será político-sociologicamente viável em eleições antecipadas (2026 é ainda muito longe para prever a evolução no processo de normalização) e
O CHEGA não está nada interessado nisso, pelo que é melhor que no PSD tirem o cavalinho da chuva.
As razões do CHEGA parecem-me aliás óbvias:
vai querer um grande resultado nas eleições europeias de 2024, em que 2 eleitos estão garantidos, provavelmente terá 3 e pela tendência atual poderia até improvavelmente chegar a 4, o que exige considerar o PSD o seu adversário direto;
O processo de normalização que vai continuar a seguir não significa que deixe de ser um partido radical, mas que vai moderar os extremismos mais chocantes e concentrar-se numa linha populista contra os “políticos” e as “elites”, pelo que tem de tratar o PS e o PSD como farinha do mesmo saco;
Imagino que Ventura tenha percebido que deve seguir o exemplo de (i) Marine Le Pen, quenão é impossível que sejafutura presidente de França e do seu partido que é o segundo mais votado, e de (ii) Georgia Meloni, primeira-ministra de Itália e do seu partido que é o primeiro de Itália e com as sondagens a darem mais de 30% e por isso em crescimento após as eleições legislativas do Outono.
Ou seja, como a “brisa matinal” cantada por Fernando Pessoa, Ventura “como tem tempo não tem pressa”: Copiando Le Pen e Meloni, precisa de melhorar a qualidade dos dirigentes, afastar os mais radicais, mas sem deixar de ter os partidos do “centrão” como os adversários.
E ainda não chegou a altura de mudar como fizeram aparentemente os “Irmãos de Itália” de Meloni, pois o radicalismo ainda é muitíssimo forte e lhe é útil para os seus desígnios.
Por isso, não faz qualquer sentido o PSD sonhar com o apoio do CHEGA, sendo equívoco quanto a isso.
Pelo contrário, o PSD tem de fazer pela vida e saber que Montenegro só será Primeiro-Ministro se com o IL, o CDS e – por que não? – com alguns dissidentes do PS que poderão surgir como foram para Sá Carneiro os “Reformadores”, conseguir ter mais deputados do que os partidos da ex-“geringonça”.
Em resumo: entre PSD e CHEGA o resultado é de soma zero, ou ganha um ou ganha o outro.
O ELOGIO
No meio da confrontação entre professores e Governo, há um terrível problema que, a consolidar-se, seria o desaparecimento dos exames, ou seja, da admissão do risco para quem não trabalhar, da avaliação (de alunos e até de professores) e da comparabilidade.
A questão não é totalmente ideológica pois também à Esquerda há quem esteja preocupado. Mas, parece, quem está dividido será o Governo, com o Ministro da Educação a querer acabar com os exames no final do Secundário e a Ministra do Ensino Superior, Elvira Fortunato, a querer aumentar o grau de exigência.
O Presidente da República anunciou que estava resolvido o dilema e que se vão manter os exames no final de secundário.
O elogio é, pois, para o “Decisor desconhecido”, que admito que seja um híbrido de Presidente da República e Primeiro Ministro.
Agora que venham novas ocasiões para elogios, se os exames forem de novo um momento essencial no processo educativo.
LER É O MELHOR REMÉDIO
Uma excelente entrevista (como é habitual) de Luis Almeida, que ouvi na Antena 2, despertou-me para o livro de José Manuel Garcia, “O Terrível – A Grande Biografia de Afonso de Albuquerque” (Esfera dos Livros).
Albuquerque, personagem com claros e escuros, foi como dizem os anglo-saxónicos “larger than life” nos 6 anos em que foi Governador do que chamou “Estado da India” (1509-1515): entre muitos outros feitos, conquistou Goa, Malaca e Ormuz, que seriam com Diu (onde só em 1535 se pôde construir o imponente forte que vale uma viagem) os pilares do projeto de D. Manuel I de criar um império marítimo (talassocracia) português no Oriente.
Para se perceber esses tempos, este parece-me um livro adequado.
A PERGUNTA SEM RESPOSTA
O Ministro da Economia e das Finanças acenaram em momentos diversos com a privatização da TAP a olhar para a Espanha e para a IBERIA.
É óbvio que de todos os possíveis compradores, a IBERIA parece ser a menos conveniente.
Daí as perguntas: só querem que haja concorrência e, como no futebol se dizia, são 11 de cada lado e no fim ganham os alemães? Ou temem que mais ninguém esteja interessado? Ou, pior ainda, há desespero e temor que seja inviável manter a TAP?
A LOUCURA MANSA
Há cerca de 40 anos soube-se quanto custaria a contratação de um CEO feita pelo Governo de Margareth Thatcher para a quase falida British Steel, uma enorme empresa pública.
Perante o escândalo do valor revelado, ela foi à Câmara dos Comuns e explicou que ele iria ganhar tudo isso apenas se conseguisse durante o seu mandato colocar a British Steel em situação de “breakeven”… e que esse enorme valor correspondia ao montante das perdas sofridas em cada dia.
A loucura é que a questão renasça na TAP décadas depois, com o populista radical Bloco de Esquerda ainda por cima a querer que um compromisso do Estado seja desrespeitado.
Carta do Dr. José Sá Fernandes (JSF)
Foi enviada à SIC, mas reproduzo-a também aqui:
DIREITO DE RESPOSTA
No espaço de comentário que mantém na Sic Notícias, no programa emitido no passado dia 31/01/2023, o Dr. José Miguel Júdice dirigiu-se-me em termos injustificadamente desprimorosos – eu sou tratado por “o tal Sá Fernandes” –, tendo-me ainda imputado factos não verdadeiros ou que carecem de esclarecimento.
A propósito do Palco/Altar a instalar no Parque Tejo por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, responsabilizando-me pela falta de coordenação desse projeto, o Dr. Júdice disse “eu desconhecia em absoluto que o tal Sá Fernandes fosse coordenador, eu pensava que ele era o coordenador dos investimentos feitos pelo Estado”; o Dr. Júdice pensava bem, eu sou o coordenador do projeto no que diz respeito aos trabalhos a cargo do Governo, tendo ficado claro e expresso, no memorando de entendimento celebrado entre todas as partes envolvidas na organização do evento, que a responsabilidade por tal palco era, e é, da Câmara Municipal de Lisboa. Não me pode por isso ser assacada qualquer responsabilidade pelos termos em que essa obra foi projetada ou aprovada.
Nessa sua rubrica, o Dr. Júdice referiu-se ainda, em termos críticos, ao custo dos projetos de instalação de torres multimédia e de casas de banho; é matéria que me cabe coordenar e sobre a qual estou perfeitamente descansado, porque estão a correr concursos internacionais para esse efeito, os quais podem ser sindicados por qualquer interessado.
Finalmente, o Dr. Júdice quis ainda enxovalhar-me, responsabilizando-me pelo custo de 18 milhões de euros que a Câmara de Lisboa teria pago por causa do “bloqueio” da obra do Túnel do Marquês, no contexto de uma providência cautelar por mim proposta há quase 20 anos. Não sei onde é que o Dr. Júdice foi buscar esse valor, mas há uma coisa que eu sei e o Dr. Júdice também devia saber: é que quem suspendeu a execução da obra não fui eu, foram os tribunais. E isso aconteceu com o fundamento na falta das adequadas avaliações de impacto ambiental, que, posteriormente (e por causa da providência cautelar), vieram a ser feitas e permitiram corrigir ou melhorar o projeto.
José Sá Fernandes
Resposta de JMJ
Tem razão o queixoso num ponto: a certa altura saiu-me, sem intenção, a expressão “o tal Sá Fernandes”, o que era escusado e lamento, ainda que em regra aceite com resignação cristã esse tipo de frases quando delas sou destinatário.
Não gostou JSF de ser criticado. Mas eu também não gostei que em 2007, era o tempo da campanha eleitoral para a CML ganha por António Costa, de quem eu era o mandatário jurídico, ele afirmasse que a “ideia para a frente ribeirinha é vendê-la aos interesses imobiliários” de construtores/especuladores e dizendo que eu os representava. Isso era falso e se fosse verdade eu iria cometer ilegalidades e até crimes.
António Costa, como bom político, perdoou-lhe e rapidamente o integrou na sua equipa camarária.
Mas comparado com o que ele disse de mim, dizer “o tal Sá Fernandes” é quase uma carícia…
Seja como for, o Dr. José Sá Fernandes disse que não sabia “onde é que o Dr. Júdice foi buscar esse valor” de 18 milhões de euros pagos ao construtor do Túnel do Marquês pela suspensão das obras durante alguns anos.
Bom, ele está esquecido, pois foi o que a CML – quando era já vereador – pagou por acordo ao consórcio construtor depois de ter sido condenada a pagar 24 milhões pelo tribunal arbitral, segundo revela o Jornal de Notícias de 24 de março de 2010.
Foi culpa dele e/ou dos tribunais? Todo o atraso foi de sua culpa ou não? Não estudei o assunto, mas a verdade é que o STA em recurso não manteve a providência cautelar o que poderia levar a afirmar que o Dr JSF fora temerário e com isso atrasado a obra.
Mas eu nada disse sobre isso, não o culpei de nada, apenas afirmei que isso provava que ele não era fiável por ser “muito mau a calcular a relação custo/benefício”. O que é a minha opinião, pois a demora nas decisões judiciais era um facto público e notório que iria ocorrer.
Finalmente ele concordou com a minha surpresa, pois eu achava que ele não era o coordenador geral da JMJ. Mas quem o afirmou teria alguma razão: em julho de 2021, o Primeiro-Ministro nomeou-o “coordenador do “Grupo de Projeto” da JMJ, que – e cito – “vai também acompanhar e preparar a requalificação urbanística e a valorização ambiental e ecológica da zona ribeirinha onde atualmente se localiza o Complexo Logístico da Bobadela, cujos terrenos começarão a ser desocupados para efeitos da realização da JMJ 2023”.
Aparentemente, um ano depois terá sido despromovido…
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes