16 dezembro 2022 0:10
Aceitar a legitimidade da secularização por referendo da morte assistida é uma desistência da Igreja por mero estratagema político e por encosto a quem pouco se interessa pela coerência
16 dezembro 2022 0:10
Quem pretende manter criminalizada a morte assistida — como se isso a erradicasse do mundo — tem deslizado por entre vários discursos avulsos: ora se diz que criaria novos problemas (mesmo que vá aumentando a lista dos países que aceitam esta legislação), ou que a prática pode ser descontrolada (mesmo que não se aponte à lei portuguesa qualquer risco nesse sentido), ou finalmente que há outras prioridades (como se a vontade ou irreversibilidade de alguém que fica em cuidados paliativos devesse proibir a escolha livre de outra pessoa pela sua morte assistida). Nada resta destas alegações, nem em função da lei, nem em função da decência. Em contraste, a esquerda conservadora que votava contra a lei terá tido a prudência de mudar primeiro de argumentário (refugiando-se numa frágil alegação de que ainda faltam cumprir condições essenciais da vida, o que parece uma conversa de alhos e bugalhos e certamente nada terá de razão de princípio) e depois de desistir do tema, aceitando a legislação e esperando que as brumas da memória varram os motivos pouco explicados do seu antagonismo. Assim, chegamos à última das motivações contra a lei: é um problema de consciência e, portanto, deve ser votada em referendo.