Opinião

Foi-se o dinheiro e vai-se a TAP

Foi-se o dinheiro e vai-se a TAP

Mariana Leitão

Chefe de Gabinete e membro do Conselho Nacional da IL

O que dizem agora os eleitores que votaram no PS desde 2015 na convicção de que iam ter uma TAP pública?

A história da TAP já vai longa, mas é importante recapitularmos algumas partes para percebermos que há uma série de decisões em que os interesses dos portugueses raramente são considerados e acautelados. As decisões tomadas pelo Governo do PS no âmbito deste dossiê são um exemplo perfeito.

Cingindo-me apenas à história mais recente, em 2015 fechou-se um contrato de venda e 61% do capital da TAP passou para a gestão privada, decisão do Governo de Pedro Passos Coelho, na altura fortemente criticada pelos socialistas.

Nesse mesmo ano, havia eleições em outubro e o PS apresentou no programa eleitoral a intenção de não permitir que o Estado perdesse a titularidade sobre a maioria do capital social da empresa.

Quando, após as eleições, o PS formou Governo e António Costa se tornou primeiro-ministro, veio reiterar, desde logo, a intenção de o Estado voltar a ser o maior acionista da companhia. E pouco depois o Estado passou então a deter 50% da TAP, cumprindo com o objetivo do Governo, que dizia ser uma medida crítica para o país.

Esta reversão da privatização foi um erro monumental, denunciado, aliás, pelo Tribunal de Contas, já que o Estado recuperou o controlo acionista da TAP quando reverteu o processo de privatização feito pelo Governo de Passos Coelho, mas perdeu direitos económicos e passou até a assumir mais responsabilidades financeiras. Ou seja, na prática, o Estado tornou-se o maior acionista, mas não passou a mandar na empresa, assumindo mais riscos do que os acionistas privados e ficando mesmo o único responsável em caso de incumprimento da dívida por parte da transportadora aérea nacional.

Não faz sentido nenhum termos uma companhia aérea. É completamente irrelevante se somos transportados pela TAP ou por outra empresa qualquer. Não há qualquer interesse estratégico em ter uma companhia aérea. Não faz qualquer diferença para a afirmação do país ou para a nossa reputação internacional e também não é o facto de a propriedade ser pública que determina o sucesso ou insucesso da TAP.

No entanto, até aqui, mesmo não se concordando com a estratégia seguida, sabendo os enormes custos que implicava para o país e o quão irrelevante era o Estado ser maioritário na TAP, o PS tinha cumprido a promessa feita de reverter a privatização.

Em 2020, António Costa e Pedro Nuno Santos, os grandes impulsionadores e responsáveis pela estratégia seguida relativamente à TAP, entraram numa obstinação ideológica de que ter o controlo de uma companhia aérea era algo essencial para o país e decidiram que tinham de salvar a TAP, na sequência da pandemia e dos fortes prejuízos sofridos pela TAP devido à paralisação do tráfego aéreo.

E, nessa altura, o Governo não encontrou melhor opção do que ficar com 72,5% de uma empresa que em apenas um dos últimos dez anos conseguiu apresentar resultados positivos e que só em 2018 e 2019 – período pré-pandemia, sublinhe-se – apresentou prejuízos superiores a 100 milhões de euros/ano.

Em 2021, com o aumento de capital, a TAP regressou à propriedade exclusiva do Estado e, por força dessa obsessão socialista, a conta para todos nós pagarmos já vai em 3,2 mil milhões de euros, mais do que o pacote de medidas para as famílias anunciado pelo PS para fazer face ao aumento do custo de vida.

Assente em pressupostos ideológicos e nada lógicos, esta foi uma decisão que, além de muito cara, não trouxe qualquer resultado substancial para o país ou para os portugueses. Só que António Costa e Pedro Nuno Santos estavam confiantes na sua estratégia, confiantes de que estavam a cumprir o seu programa e confiantes no seu alinhamento aos partidos da extrema-esquerda, os fanáticos das nacionalizações, e que na altura constituíam com o PS a gerigonça, mesmo perante todas as evidências de que a operação estava destinada ao fracasso.

Agora temos o ministro das Infraestruturas e da Habitação, que ainda há um ano dizia que em 2025 a TAP já estaria em condições de devolver algum do dinheiro injetado ao Estado português, a anunciar que, afinal, se vai avançar para a privatização da TAP já no próximo ano.

Não deixa de ser curioso como para Pedro Nuno Santos, em 2020, não havia outra solução senão resgatar e nacionalizar a TAP e, em 2022 e 3,2 mil milhões de euros depois, afinal, a integração da empresa num grande grupo de aviação possa ser a única maneira de assegurar a sua viabilidade, tal como o próprio governante reconhece.

Tudo isto ganha contornos ainda mais sui generis quando os portugueses se tornaram todos acionistas de uma companhia aérea, pagaram as suas ações por via dos impostos que, diária e coercivamente entregam ao Estado, mas no final do processo vão ficar sem as ações e sem o dinheiro.

Isto porque ficámos todos a saber na semana passada que afinal, ao contrário do que Pedro Nuno Santos afirmou na altura da “salvação” da TAP, não vai haver reembolso algum ao Estado português pela intervenção pública, pelos tais 3,2 mil milhões de euros.

Que responsabilidades exigem os portugueses a António Costa e a Pedro Nuno Santos que, podendo evitar um rombo desta magnitude nas finanças nacionais, decidiram que o Estado tinha de ter uma companhia aérea de bandeira, para agora reverterem essa decisão sem qualquer respeito pelos compromissos que tinham assumido com os eleitores e sem qualquer respeito pelo dinheiro gasto nessa obstinação perfeitamente evitável?

E o que dizem agora os eleitores que votaram no PS desde 2015 na convicção de que iam ter uma TAP pública? E o que dizem os restantes portugueses que, não querendo financiar esta aventura, a tiveram de pagar porque era esse o desígnio do PS e, agora, não só ficam sem o dinheiro como ficam sem a TAP?

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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