Os ontem que cantam
Alguns avanços fizeram com que vivêssemos hoje num espaço europeu em que o escrutínio a quem governa é vinte vezes maior do que há 20 anos. E grande parte do que hoje é tema, nem sequer o era há 15, 20 ou 30 anos
Consultor de comunicação
Alguns avanços fizeram com que vivêssemos hoje num espaço europeu em que o escrutínio a quem governa é vinte vezes maior do que há 20 anos. E grande parte do que hoje é tema, nem sequer o era há 15, 20 ou 30 anos
De 2017 até aos dias de hoje, o mundo não melhorou. Nestes últimos cinco anos e além da mais recente invasão russa da Ucrânia, naquela que será retratada pelos livros de história como a guerra de Putin, existiu uma pandemia global que virou muita coisa do avesso.
Mas já nesse ano de 2017 que parece agora tão mais longínquo do que na realidade é, existia um crescimento galopante dos extremos políticos ou dos partidos radicais à direita. Quase em paralelo, era publicado um livro extremamente relevante. Factfulness. De forma muito resumida, trata-se de uma obra que através de dados totalmente factuais exemplifica como o mundo até há 5 anos, ano após ano, tinha caminhado para um lugar bastante melhor em todos os indicadores que interessam. Em parte, e como sustenta o autor, tal se devia a uma matriz internacional fundada e desenvolvida de acordo com princípios democráticos. O fim da história ideológico que Fukuyama vaticinava de forma racional já em 1992, decretando a democracia liberal como finalidade primeira e última de qualquer país no mundo, não deixa de sustentar estes indicadores e o processo evolutivo que acaba por conduzir os povos à mesma.
Sem ignorar a óbvia veemência que se deve ter a tudo e tanto que está mal, é cruel, injusto ou criminoso em democracias, sobrava o facto de as perceções da maioria das pessoas estarem totalmente alinhadas quando consideravam que muita coisa corria geralmente pior até 2017. Maior ou menor o tema, a amplificação influenciava. O excesso de informação e sobretudo da desinformação, a pouca profundidade na dissecação da primeira, a viciação e o ruído noutro, fez e faz com que a emoção substitua demasiadas vezes e como nunca a “razão” nas considerações e análises.
Alguns avanços fizeram com que vivêssemos hoje num espaço europeu em que o escrutínio a quem governa é vinte vezes maior do que há 20 anos. E grande parte do que hoje é tema, nem sequer o era há 15, 20 ou 30 anos. Para o bem e para o mal. Importa compreendê-lo porque se tal não deixa de representar um desenvolvimento democrático do qual é impossível recuar, também significará uma maior facilidade no ataque à própria democracia por meios que lhe são alheios. Isto não foi, nem é explicado o suficiente. Assim como um certo fascínio que existia na Europa por personagens como Putin e ao seu modus operandi que não nasceu a 24 de fevereiro deste ano.
Será impossível voltar a 2017 e por mais que grande parte das perceções estivessem ao lado nessa altura, nem é desejável. Tudo mudou. Existem perigos e consequências muito maiores, mas a claridade Ocidental hoje devia ser maior. Se os amanhãs não cantam, os ontens ainda menos. No entanto, aí estão as Meloni’s e os seus seus discos riscados no poder para demonstrá-lo uma vez mais.
Ainda haverá hojes afináveis depois disto tudo?
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes