Opinião

A austeridade é uma escolha

A austeridade é uma escolha

Rui Rocha

Deputado e membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal

António Costa pode refugiar-se em jogos de palavras, recusando falar em austeridade, da mesma maneira que procura ludibriar os portugueses com a confusão entre valores reais e nominais, mas a realidade aí está

O Orçamento do Estado (OE) para 2023, apesar de toda a propaganda que a máquina socialista possa vir a fazer, falha clamorosamente aos pensionistas, aos funcionários públicos, às famílias, aos jovens e às empresas.

No que diz respeito aos pensionistas, a base de cálculo de atualizações futuras fica prejudicada faca ao que resultaria da aplicação da lei Vieira da Silva. Se dúvidas houvesse, confirma-se que que enquanto o primeiro-ministro estendia uma mão, acenando com o adiantamento de meia pensão em 2022, tinha já a outra mão escondida atrás das costas com a tesoura com a qual viria a concretizar o corte em 2023. O golpe está agora oficializado.

Os funcionários públicos, por seu lado, assistirão à confirmação de uma perda histórica de poder de compra. Na verdade, se considerarmos a inflação de 2022 (que vai, aliás, situar-se acima das previsões do Governo) e a de 2023 (que muito provavelmente ficará também acima das previsões de Fernando Medina), todos verão o seu rendimento real deteriorar-se, mesmo aqueles que têm salários mais baixos.

Já as famílias verão o seu rendimento afetado por uma atualização dos escalões de IRS que fica muito aquém do que seria necessário para garantir neutralidade fiscal face aos valores da inflação acumulada em 2022 e 2023. O sinal não podia ser mais claro: as famílias continuarão a ser sujeitas a uma carga fiscal desproporcionada e o Governo, em vez de lhes permitir maior liberdade de utilização dos seus rendimentos, opta por mecanismos paternalistas como a devolução de 125 euros, que concretizará por estes dias, ou a redução da retenção na fonte para quem tem crédito à habitação. Para António Costa, o dinheiro não é das pessoas, é do Estado. E o Governo gere esse dinheiro como entende, de acordo com as suas conveniências de ciclo político.

Os jovens, entretanto, beneficiarão do alargamento do IRS Jovem. Mais uma medida apresentada com pompa e circunstância pelo executivo PS. Só que também neste ponto o diabo está nos detalhes. De acordo com o próprio relatório do OE, esta decisão vale 15 milhões de euros, aplicando-se a cerca de 100 mil jovens. Estamos, portanto, a falar de um “benefício” adicional correspondente, em média, a 12,5 euros mensais. Os jovens encararão certamente o futuro com muito mais confiança com este desagravamento que lhes permitirá libertar rendimento para tomarem um café a cada dois dias.

No entanto, o OE, ao contrário do que alguns querem fazer crer, falha também às empresas. O truque do Governo é, neste caso, apontar para duas ou três árvores procurando que não se veja a floresta. Todavia, uma ou outra medida pontual de alcance muito limitado não alterarará um ambiente de negócios totalmente avesso ao investimento, ao risco e ao sucesso empresarial, persistindo a incapacidade reformista que permitiria simplificar, desburocratizar, desagravar impostos ou acelerar a aplicação de justiça.

O OE para 2023 falha assim a todos e, com isso, falha ao país. António Costa pode refugiar-se em jogos de palavras, recusando falar em austeridade, da mesma maneira que procura ludibriar os portugueses com a confusão entre valores reais e nominais, mas a realidade aí está.

Depois de sete anos de Governo do PS, o país não está em condições, na avaliação socialista, de dar aos portugueses outra coisa que não sejam cortes e estagnação. Neste cenário, a discussão fundamental deve ser colocada a dois níveis. O primeiro diz respeito a saber se podia ter sido feito um caminho alternativo durante esses sete anos para que em 2023 não se tivesse para entregar uma mão cheia de cortes e a outra mão cheia de estagnação. O segundo debruça-se sobre a possibilidade de fazer diferente agora.

Para ambas as perguntas, a resposta é clara. Sim, teria sido possível fazer outras escolhas políticas nos últimos sete anos, que permitiriam ao país reformar-se e crescer. E, sim, seria possível fazer um OE com opções diferentes, tendo em conta, nomeadamente, a enorme arrecadação de receita fiscal de 2022 e 2023. Esta austeridade, mesmo que António Costa queira chamar-lhe outra coisa, é claramente uma opção que todos somos chamados a pagar.

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