Opinião

Costaquistão

Costaquistão

Rui Rocha

Deputado e membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal

O primeiro-ministro que prometeu há apenas uns meses que não ira abusar da maioria absoluta parece agora empenhado em que Portugal se converta numa espécie de Costaquistão, obediente, servil e que tem como objetivo principal não desagradar ao chefe

Na passada quarta-feira, numa audição da Comissão de Ordenamento do Território, uma deputada do PS saiu momentaneamente do anonimato para exigir que a gravação e o registo em ata de uma intervenção do deputado da Iniciativa Liberal Carlos Guimarães Pinto fossem apagados.

Perante a gravidade da situação, que poderia ser vista como uma tentativa de censura cometida pelo partido que detém a maioria absoluta, o grupo parlamentar do PS, pela voz de Pedro Delgado Alves, apressou-se a pedir desculpa à Iniciativa Liberal e aos demais deputados que estiveram presentes na reunião pelo comportamento infeliz da deputada.

Caso se tivesse tratado de um episódio isolado, este pronto pedido de desculpas encerraria definitivamente a questão e tudo passaria à história como não mais do que um mau momento para a democracia sem que, todavia, dele se pudessem retirar outras consequências. O problema é que esta tentativa atabalhoada de silenciamento de questões que não agradam ao PS e ao Governo é coerente com um comportamento reiterado que revela tiques de autoritarismo já presentes antes da maioria absoluta, mas que se reforçaram depois desta.

Não se pode considerar normal, por exemplo, que a ministra da Agricultura faça bullying político à Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), recusando-se a responder a críticas sobre a gestão da seca e remetendo para uma posição desfavorável ao PS que a CAP terá tomado durante a campanha das legislativas. E também não é normal que Fernando Medina, depois de ter sido apanhado na trapalhada da nomeação de Sérgio Figueiredo, tenha reagido de forma despeitada, dizendo perceber as razões do nomeado quando acabou por renunciar ao cargo e revelando, assim, total incompreensão pelas fundadas razões que levaram praticamente toda a gente a manifestar indignação pela forma como o processo foi conduzido.

Nem é seguramente normal que, com pouco mais de seis meses decorridos sobre a tomada de posse de António Costa, o PS já tenha chumbado a audição de 16 governantes na Assembleia da República. Da mesma forma que é revelador sobre o desejo de debate democrático do Governo, ou da falta dele, que continue paralisada pelo PS a intenção de retomar uma presença regular do primeiro-ministro no Parlamento depois de, já na anterior legislatura, os socialistas se terem associado ao PSD para acabar com os debates quinzenais.

De igual modo, a própria forma como a ministra Ana Abrunhosa decidiu “esclarecer” os factos relacionado com a obtenção de fundos comunitários por uma empresa detida pelo marido, assinando um artigo de opinião e furtando-se ao contraditório, constitui mais um sinal de que a transparência deixou há muito de ser a prioridade do Governo. E, definitivamente, não é aceitável que António Costa, nas vezes em que comparece no Parlamento, se apresente cada vez mais irritado, perdendo as estribeiras e as maneiras sempre que é confrontado com a realidade do país e chegando a aconselhar um partido, no caso a Iniciativa Liberal, a calar-se.

Os sinais estão aí. O primeiro-ministro que prometeu há apenas uns meses que não ira abusar da maioria absoluta parece agora empenhado em que Portugal se converta numa espécie de Costaquistão, obediente, servil e que tem como objetivo principal não desagradar ao chefe. Infelizmente, António Costa não é o primeiro animal feroz socialista com que nos confrontámos nos últimos anos. Sabemos onde este instinto levará se não for contrariado. Por muito que isso custe ao primeiro-ministro, cá estaremos para o contrariar.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas