Opinião

O negócio das almas no mercado da extrema-direita

30 setembro 2022 0:02

O discurso religioso instalou-se como forma de representação, em particular da extrema-direita, e o seu sucesso é uma das explicações substanciais das mudanças eleitorais de que aquela tem beneficiado

30 setembro 2022 0:02

A linguagem apocalíptica não é novidade no discurso da extrema-direita, como não o é esse populismo que pretende associar pessoalmente cada um dos seus líderes a uma promessa salvífica, a uma “missão” que cumpriria em representação do povo agradecido. Essa forma de afirmação da política como um destino a que se deve obediência percorre-nos por todo o século XX e pelos nossos anos. No entanto, o que é novidade no Sul da Europa, em países de influência católica mas que viveram profundos processos de secularização, como em Portugal, sobretudo como França, algo menos em Espanha e Itália, é o regresso do enunciado místico como núcleo da organização política, imitando os EUA e o Brasil. O discurso religioso instalou-se como forma de representação, em particular da extrema-direita, e o seu sucesso é uma das explicações substanciais das mudanças eleitorais de que aquela tem beneficiado. A potência deste discurso não deve ser subestimada: ele recorre ao reprimido da civilização, os medos ancestrais que sempre convivem connosco; sendo uma crença, situa-se no terreno da irracionalidade e, portanto, não é argumentável; e empossa o chefe de uma transcendência mágica que é o seu cetro. Como o estratagema resulta, vai ser radicalizado, Trump continua a ser disso o farol mundial. O século XXI vai ser o das identidades religiosas e de grandes cruzadas.